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Entrevista Pedro Trengrouse

É preciso um choque de democracia no futebol brasileiro

Consultor da ONU para a Copa, professor da FGV diz que governo, clubes e torcida precisam rediscutir atual modelo do esporte no país

ADRIANO BARCELOS DO RIO

A goleada de 7 a 1 sofrida para a Alemanha na Copa trouxe, ao menos, um legado positivo: o futebol brasileiro ingressou na agenda nacional, da sociedade e do governo.

Professor da FGV (Fundação Getulio Vargas) e consultor da ONU para a Copa-2014, Pedro Trengrouse esteve por trás das discussões que levaram ao texto do projeto hoje conhecido como Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte, que tramita no Congresso e é a nova aposta para pôr nos trilhos a dívida dos clubes, superior a R$ 3 bilhões.

Para ele, equalizada a dívida com o respectivo parcelamento, o futebol exigirá que todos os atores (governo, Congresso, federações, clubes, atletas, imprensa e torcida) discutam uma agenda para a modalidade no século 21. Leia trechos da entrevista à Folha.

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Folha - A pauta da dívida fiscal dos clubes parecia ter sido superada com a Timemania (em 2005). O que deu errado?

Pedro Trengrouse - Deu errado porque a loteria não arrecadou o que foi prometido. Havia previsões dos técnicos de que a arrecadação seria de R$ 520 milhões anuais, e ela ficou em menos de R$ 100 milhões no primeiro ano. Aí, a arrecadação não fez frente à dívida que os clubes confessaram ter. Um parêntese: como ninguém sabe o valor, o governo precisava que se consolidasse um número e pediu aos clubes que confessassem um número e deixassem de contestar os valores. Os clubes confessaram dívidas que não tinham e, como a Timemania não funcionou, a situação está pior do que antes.

Se aprovada, a nova Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte terá que impacto?

Nada disso é o ponto central dos problemas do futebol brasileiro. As dívidas (dos clubes) são consequência dos nossos problemas. O que não quer dizer que não seja urgente, mas está longe de ser a solução.

Não falta capacitação dos cartolas? O que levou os clubes a contraírem a dívida?

É óbvio que pessoas de bem passaram por esses clubes ao longo dos anos. O problema não está nas pessoas, mas no sistema. Não dá para imaginar que todos sejam incompetentes. O sistema foi criado no começo do século 20, quando o futebol não era um negócio.

Qual é o principal problema do atual sistema?

Vamos pegar como exemplo o Flamengo, que tem orçamento em torno de R$ 300 milhões por ano. Esse dinheiro vem dos sócios ou da grandeza da torcida? Se vem da torcida, é difícil imaginar que o presidente do clube representa 40 milhões de torcedores sendo eleito com 1.414 votos. Será um modelo eficiente para o século 21? É preciso um choque de democracia.

O senhor defende que todos os atores assumam responsabilidade para melhorar o futebol. Qual é a parcela do governo?

O futebol tem problemas crônicos que dizem respeito ao poder público: quase 90% dos clubes brasileiros jogam em média quatro meses e meio por ano. Clube que não joga não gera talentos. Ronaldo, por exemplo, hoje talvez não tivesse sido descoberto pelo São Cristóvão, que não joga o ano inteiro. Estimativa da FGV indica que, se esses clubes jogassem nove meses por ano, isso geraria R$ 600 milhões por ano e 30 mil novos empregos. É preciso que se abandone o foco em legislação e medidas que consideram só os grandes clubes.

Na sua projeção de agenda do futebol para o século 21, o que caberia a clubes e torcedores?

Eu digo que atores do futebol que nunca se reuniram têm de se encontrar para debater a agenda do século 21, mas, se me perguntar o que cada um tem de fazer, eu humildemente direi que não sei. Mas, se 1% dos torcedores que dizem ter um clube aderir a um programa de sócio-torcedor, isso terá um impacto de R$ 1,5 bilhão. Se você se importa, tem de participar.

O trabalho feito pela Alemanha é um modelo aplicável?

O Brasil não é a Alemanha. E ela não é perfeita. Mas o resultado no futebol não é uma equação matemática: se fizer isso, vai ser campeão. Isso não existe. Cada um trabalha com a matéria-prima que tem. E a do futebol brasileiro é bem melhor que a do alemão. Um trabalho no Brasil traria resultados mais rápidos.


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