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Para a atriz Juliette Binoche, 'arte e loucura não caminham juntas'

Francesa vive escultora internada por 30 anos em "Camille Claudel 1915", de Bruno Dumont

A vencedora do Oscar por "O Paciente Inglês" precisou atuar ao lado de portadores de doenças mentais

RODRIGO SALEM ENVIADO ESPECIAL A BERLIM

Juliette Binoche, 49, passou a adolescência sob a sombra da escultora Camille Claudel (1864-1943).

Enquanto se esforçava entre aulas no prestigiado Conservatoire National Supérieur d'Art Dramatique, em Paris, e bicos de atriz, a jovem Binoche gostava de descansar em sua cama encarando o pôster que adornava a parede do quarto no apartamento que dividia com a irmã Marion.

"A face de Camille estava sobre minha cama o tempo todo", lembra-se a atriz vencedora do Oscar por "O Paciente Inglês", em 1997. "A paixão e a sua vontade de se expressar me comovem até hoje."

A idolatria da atriz pela mulher que virou parceira e amante de Auguste Rodin (1840-1917) até ser traída pelo escultor, ajudou Juliette a encarar um de seus papéis mais complicados em "Camille Claudel 1915", destaque de hoje do festival Varilux.

O longa de Bruno Dumont, que passou batido no último Festival de Berlim, é um agonizante exercício de dramaturgia sobre três dias esporádicos de Camille no hospício no qual a artista viveu contra sua vontade por 30 anos.

Na experiência, o diretor se recusou a entregar o roteiro aos atores e exigiu que sua protagonista encontrasse a personagem lendo cartas escritas por Camille. "Era uma forma de controle dele. Eu falei que precisaria de algumas explicações, porque não fui educada ou vivi como Camille. Foi quando Bruno me falou sobre as cenas e anotei tudo rapidamente em um guardanapo", brinca Juliette.

Dumont, um diretor interessado em arrancar interpretações viscerais, como fez em "A Humanidade" (1999), que rendeu prêmios em Cannes à dupla de protagonistas, não facilitou a vida de Juliette.

Para alcançar um realismo cortante, filmou em um manicômio no sul da França.

"Visitei casas de repouso para pessoas com problemas mentais para me acostumar. Foi difícil saber como me comportar, porque minha reação era ficar envergonhada", explica a atriz. "Eu era uma estranha naquele mundo."

Nas filmagens, Juliette Binoche encarou outro desafio: interpretar com pacientes de verdade, portadores de demência, paranoia, Alzheimer e outras doenças.

"A primeira regra que estabelecemos foi que eles deveriam me chamar de Camille o tempo todo para não atrapalhar", lembra a francesa.

Em uma das cenas mais fortes do drama, Camille grita em desespero contra uma das pacientes. A preocupação da equipe e dos médicos era com a reação da atriz amadora.

"Foi o momento de maior temor do filme. Mas ela sabia que havia um jogo em andamento", diz Juliette.

"No primeiro take, eu gritei de forma mais suave e ela olhou para mim e disse: Você está brincando, eu não acredito em você'. Depois disso, eu fiz outras cenas na confiança de que ela se recuperaria. Depois, choramos abraçadas por 20 minutos."

A atriz, que fala calmamente em um inglês de forte sotaque francês, só se exalta quando tenta imaginar as razões do internamento de sua personagem.

"O homem que ela mais amou na vida virou seu maior inimigo. A crise de paranoia dela foi gerada pela solidão, pela pobreza e pela traição que sofreu", defende Juliette.

"Não foi porque ela era uma artista genial. Não acredito nessa merda. Arte e loucura não caminham juntas. Isso é bobagem."


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