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Crítica - Romance

Boa narrativa erra o tom ao retratar a mulher

Em obra de estreia divertida e bem estruturada, Edward Kelsey Moore não consegue superar visão masculina

CLARA AVERBUCK ESPECIAL PARA A FOLHA

O violoncelista Edward Kelsey Moore não esperava muito de seu primeiro romance, "Três Amigas, Todos os Domingos". Queria só que uma editora acreditasse nele e que tivesse grana para trocar os pneus do carro e vender seus livros na carroceria.

Acabou estreando em 15º nos mais vendidos do "New York Times", um feito e tanto para um autor iniciante.

As amigas do título, apelidadas na juventude de Supremes, em referência ao grupo de Diana Ross, veem-se todo domingo no restaurante do velho Earl, primeiro negro a ter um estabelecimento do tipo naquelas bandas, e falam de suas vidas, seus anseios, suas alegrias e mazelas.

Apesar de passagens divertidas, imagens fortes, bons diálogos e um enredo bem estruturado, o autor não consegue superar a visão masculina de como uma mulher deve ser e se portar.

As personagens (inclusive as fantasmas --isso mesmo, almas desencarnadas que interagem) são mulheres fortes, porém sem nenhum poder.

Clarice luta para manter as aparências diante das infidelidades do marido. Sim, é algo comum, mas imagine o contrário num romance: um personagem homem lutando para manter as aparências diante de traições da mulher. Parece verossímil? Estaria numa ficção como algo natural?

Um homem com a "honra" manchada é perdoado por toda a sorte de comportamento violento. Já a mulher, segundo o autor, não deve cair no estereótipo de "mulher negra brava", que ele vê como algo forçado pela cultura pop e não reconhece no dia a dia.

Diz ele: "Se você ama alguém e essa pessoa te decepciona ou parte seu coração, você pensa como posso encontrar uma maneira de viver com isso, como posso fazer isso funcionar?' mais do que onde está a arma?'".

Certo. A mulher deve ser passiva. O homem está apenas sendo homem. Certo.

Odette, que herdou da mãe corpulenta, desbocada e maconheira o dom de falar com fantasmas, vê-se às voltas com uma doença, buscando apoio nas amigas de infância. Ela é a mais forte do trio e responsável pelos momentos mais divertidos do livro.

Barbara Jean é filha de uma stripper que morreu de tanto beber e passou a vida procurando um homem que a sustentasse e à filha. É uma mulher belíssima e rica, mas um "caso do passado" reaparece para assombrá-la. E não, esse não é um fantasma.

O autor consegue trazer questões raciais à tona de forma sutil, entranhadas na rotina dos personagens. A ambientação é competente, fazendo o leitor sentir como se andasse por Leaning Tree, cidade onde se passa a trama.

O talento de Moore para o romance não está em questão, e sim a representação da mulher. Quem sabe na próxima ele não entenda que uma personagem que toma as rédeas da vida e põe a boca no trombone não está sendo uma "bitch", como ele diz? Esperamos ansiosamente.


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