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Crítica Documentário/É Tudo Verdade
'Canção da Floresta' retrata americano que tenta realizar seu sonho africano
RICARDO CALIL CRÍTICO DA FOLHADurante metade da projeção de "Canção da Floresta", suspeitamos que seu protagonista, Louis Sarno, é o sujeito de que falava Maiakóvski na frase: "Dizem que em algum lugar, parece que no Brasil, existe um homem feliz".
O poeta só teria cometido um erro geográfico: em vez do Brasil, a República Centro-Africana. Foi para lá que Sarno, etnomusicólogo americano, se mudou há 25 anos, encantado com a música produzida pelos pigmeus Bayaka.
Ali Sarno gravou mais de mil canções, aprendeu o dialeto local e teve um filho, Samedi, com uma nativa.
Dirigido pelo alemão Michael Obert, vencedor do prestigiado festival holandês IDFA e filme de abertura do É Tudo Verdade em São Paulo, "Canção da Floresta" é, em sua primeira metade, o retrato desse homem feliz.
Mas, grosso modo, pessoas felizes costumam render filmes apenas moderadamente interessantes, e documentários também sentem falta de conflito. Aí entra o segundo ato de "Canção da Floresta".
Cumprindo uma promessa, Louis leva Samedi aos Estados Unidos e se deprime com os excessos do sonho americano --mas também com sua falta de dinheiro, que usaria para ajudar os Bayaka.
Em um momento pungente, Louis reflete: "Quando voltar para a África, os Bayaka vão rir de mim quando disser que estou quebrado. Porque sou branco, porque sou da América, tenho que ter dinheiro. Como vou continuar lá?".
Nessa cena, aparecem as fissuras do sonho africano de Louis e fica claro que ele sempre será um estrangeiro tanto em sua terra natal quanto na que adotou.
E, então, "Canção da Floresta" torna-se o retrato de um homem dividido --e um documentário bem mais interessante do que aquele sobre um homem feliz.
