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Crítica Documentário/É Tudo Verdade

Discípulo de Coutinho faz longa original sobre perda, morte e fé

CARLOS NADER DRIBLA COM HABILIDADE E BOA-FÉ OS RISCOS ÉTICOS IMPLÍCITOS NA MANIPULAÇÃO DO PERSONAGEM

INÁCIO ARAUJO CRÍTICO DA FOLHA

Carlos Nader, autor de "Homem Comum", é, num certo nível, discípulo de Eduardo Coutinho. Seu filme acompanha por quase 20 anos a trajetória do caminhoneiro Nilson, sua família, seus problemas de saúde e familiares etc.

Estamos, aqui, numa espécie de herança direta de "Cabra Marcado para Morrer", o filme seminal de Coutinho.

Ao mesmo tempo, trata-se de um filme muito original. Não é um documentário, propriamente; mais apropriado chamá-lo de "filme ensaio", pois se apoia não só na trajetória de Nilson como na obsessão do cineasta por "A Palavra" (1955), o genial filme de Carl Th. Dreyer, de que mostra vários trechos.

A associação completa-se pelas questões propostas por Nader a caminhoneiros, aleatoriamente. Tipo "você acha que a vida faz sentido"?

Para completar a operação, o próprio Nader filma uma espécie de réplica de alguns trechos de "A Palavra" (em inglês), onde insere alguns aspectos que não estavam no filme de Dreyer.

O ensaio surge da associação entre essas três dimensões: o documentário (por vezes encenado), o filme de Dreyer e o "remake" de partes de "A Palavra". A elas vêm se acrescentar diversos momentos vividos por Nilson e sua família e registrados pela câmera de Nader.

Montados e devidamente associados, temos um filme sobre a perda, a morte, a fé, a dor, a reprodução, unidos pela imagem (a possibilidade de captação e preservação da vida pelo cinema).

Se "Homem Comum" pode ser considerado "num certo nível" como discípulo de Coutinho é porque, num outro nível, os métodos são perfeitamente opostos.

Coutinho ia a campo desarmado, disposto a ouvir e se adaptar ao entrevistado. Nader molda os personagens segundo suas preocupações.

Pode-se até discutir a pertinência dessas preocupações metafísicas. O que importa é que o autor consegue, por um lado, driblar com habilidade e boa-fé (sobretudo boa-fé) os riscos éticos implícitos nessa manipulação do personagem.

E, por outro, é assim que marca sua diferença, a originalidade de sua empreitada sobre esse "homem comum" no qual busca o que ele pode ter de incomum. Talvez fosse melhor chamar a este belo filme "Homem Simples".


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