Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Ilustrada

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Crítica - Musical

Ritual de adoração a Rita Lee, peça tem cenas descartáveis

Espectador atravessa a apresentação sob tensão, no aguardo de algum deslize da protagonista, Mel Lisboa

NELSON DE SÁ DE SÃO PAULO

É tradição na Broadway testar os musicais longe da cidade. Diante da plateia, caem cenas, novas canções são compostas, personagens mudam. É teste de mercado, comercial, mas também sinal de respeito ao público.

"Rita Lee Mora ao Lado" se beneficiaria de pré-estreias assim. Em seu segundo fim de semana, mostrou vazios de ritmo e cenas descartáveis até para a mínima narrativa que a produção propõe.

Em especial, seria chance de selecionar com cuidado os quadros que a protagonista, Mel Lisboa, já pode ou não assumir. Talvez até dar mais tempo para desenvolver voz. O espectador atravessa a apresentação sob tensão, no aguardo de algum deslize ou tentando ouvir as canções.

Não que ela precisasse ser Bidu Sayão ou, na cena musical paulistana, Kiara Sasso. Judi Dench, quando enfrentou "Send in the Clowns", canção "standard" de Sondheim, maior compositor vivo da Broadway, reconheceu não ter alcance vocal nem treinamento e falou que se defendia com suas técnicas de atriz, não musicais.

Sua interpretação é hoje considerada marco. Dench chegou a ser apontada em 2008, num estudo britânico, como "a voz perfeita" por características como "pausar 0,48 segundo entre as sentenças" ou deixar cair a entonação ao longo dos versos.

Deixando de lado qualquer justificação técnica, Lisboa poderia aprender com Dench, antes de mais nada, a ter e transmitir maior segurança vocal. De resto, física e até emocionalmente, compõe bem sua imitação de Rita Lee, nos cabelos, trejeitos, passos desajeitados de dança.

Não se restringe à paródia, o que é um alívio na produção criativamente limitada de Márcio Macena --amontoando quadros decalcados de vídeos de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tim Maia, Gal Costa, até Hebe Camargo, sem justificação aceitável para uma peça sobre Rita Lee.

Lisboa se sai melhor nas cenas que envolvem comédia romântica. Também Fabiano Augusto supera a caricatura como Ney Matogrosso. Mas é Carol Portes que indica o que poderia ser "Rita Lee Mora ao Lado" --se se dispusesse a descartar o que é descartável em suas duas horas e meia.

Como no livro de mesmo nome, a personagem fictícia interpretada por Portes segue e relata a vida da cantora. É o que dá o fio narrativo para manter o espetáculo em pé. Boa comediante, dribla até a armadilha preconceituosa de algumas piadas do texto.

Mas não tem jeito. Como tantos musicais recentes, é um rito de adoração de Rita Lee, pouco importando suas características teatrais. A prova é que no último domingo a presença da cantora, anunciada no final, levou elenco e público enfim à catarse.

Lisboa chorou descontroladamente. O palco foi ocupado pela equipe inteira aos prantos, enquanto o público também às lágrimas registrava em dezenas de celulares o encontro, já disponível em YouTube e Instagram.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página