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Mônica Bergamo

Gringos viram Mickey na Disney brasileira

Para eternizar os encontros da Copa, brasileiros transformam estrangeiros em curiosidade turística e fazem 'selfies' e álbum de fotos com as várias torcidas

A professora aposentada Ana Maria Baldin, 59, embrenha-se na multidão de argentinos, corre os olhos no entorno e identifica um grupo de torcedores que ela acha interessante. "Posso tirar una foto con ustedes [com vocês]?", pergunta, sorridente, misturando português e espanhol. Posa ao lado deles e saca do bolso o celular. "Hoje estou torcendo por vocês. Amanhã, talvez", despede-se.

"Estou fazendo o álbum da Copa", conta a moradora da Vila Guilhermina (zona leste) aos repórteres Joelmir Tavares e Marcela Paes, do lado de fora do Itaquerão, no dia da partida entre Argentina e Suíça, na terça-feira. "Agora coleciono fotos com gente do mundo todo: México, Uruguai, Croácia", diz ela, que foi para os arredores do estádio em todas as partidas. Primeiro sozinha. "Depois trouxe minhas filhas, irmã, amiga."

Os brasileiros inverteram o sinal: em vez de atração para estrangeiros, transformaram os visitantes de todos os cantos do mundo em verdadeiros "pontos turísticos". Dentro e fora das arenas, nas ruas, no metrô, em Fortaleza, no Rio e em São Paulo, a coluna presenciou moradores do país formando até fila para fazer "selfies" ou filmes ao lado dos gringos mais animados. É como se estivessem em uma Disneylândia tirando fotos ao lado do Mickey para congelar um momento inesquecível.

Em Itaquera, perto da arena, a confraternização é mais fácil e intensa. Após a partida em que a seleção de seu país perdeu para a da Argentina, duas suíças viraram atração. "Gastamos o dobro do tempo para deixar o estádio, de tanto que paramos para fotos", contava a estudante Martina Conte, 29, ao lado da amiga Isabel Terumgs, 27.

Com bombons de chocolate pendurados na cabeça --um deles derreteu por causa do calor-- e relógios presos ao corpo ("para representar os itens mais famosos da Suíça", segundo Martina), elas se desdobravam para fazer as fotos com os brasileiros.

As estudantes se viravam de um lado para o outro, sem conseguir sair do lugar. Situação semelhante à de um grupo de quatro suíços com roupas e chapéus com chifres de ovelha que ficaram mais de 20 minutos atendendo --sorridentes-- a pedidos de fotos com brasileiros.

Vestindo figurino mais básico, o suíço Urs Joeger dizia à repórter Eliane Trindade que "os brasileiros gostam mais de tirar fotos do que os japoneses", após posar para uma "selfie" com a vendedora Evelin França, 32. Sem saber falar outros idiomas, ela conseguiu a foto com Joeger e o amigo Markis Werner na base do sorriso e do gestual.

Contratada como atendente no Itaquerão (R$ 120 por dia de trabalho), Evelin acumula fotos com turistas do mundo inteiro que cruzam seu caminho quando deixa o batente. Carrega na memória do celular imagens com chilenos, holandeses e argentinos. "É só eu ver um montinho de gringo que eu chego perto e peço pra tirar foto."

"A gente mostra a câmera, faz assim [mexe o dedo como se disparasse um botão] e eles entendem", explica a aposentada Ana Maria Baldin.

"Antes se falava muito de manifestações. E a gente ficava com medo. Mas aqui o clima está bom, não tem briga. Alguns protestos ainda acontecem, mas muito menos do que a gente esperava, né?"

A atmosfera de paz, amor e "festa de confraternização das nações" também atrai a hoteleira Cristiane Zinderschi, 41, de Itaquera. "Latinos são sempre mais simpáticos! Trabalho em hotel e já conheço o jeitão de cada nacionalidade. Aqui é tudo na brincadeira", diz, enquanto é abraçada por três argentinos.

Para ela, a frustração por não ter ingressos para os jogos é compensada pela interação com os estrangeiros. Mesmo assim, dispensou abordagens mais ousadas. "Um chileno veio pedir informação, disse que eu era linda e não parecia ter a idade que tenho. Mas ficamos só na conversa. Copa é amizade", diz.

Entre uma e outra abordagem para falar "do quanto o amor de Deus é enorme", Manuela Sousa Bernal, 32, integrante de um grupo da Igreja Batista que leva mensagens de fé para os turistas, aproveitava para também completar seu álbum. "É uma troca. Tem gente que pede para tirar foto com a gente também", explicava a publicitária.

"O amor de Deus é universal. Ele não veio só para uma nação. Abençoa todas", dizia Manuela, vestindo camiseta verde e amarela com a palavra "Jesus" estampada na frente. "Mostramos uma outra imagem do país. Não é só farra, Carnaval, mulher pelada e prostituição."

No intervalo do jogo entre Argentina e Suíça, Tatiane Moraes, 32, chegava ao vale do Anhangabaú, do outro lado da cidade, e seguia para a Fan Fest (área com shows e telão que exibe as partidas). De blusa e casaco da Suíça, a brasileira era confundida com uma autêntica europeia --e sentia na pele o que os gringos têm vivido.

"Acham que sou suíça!", dizia a atriz, modelo e promotora de eventos, que já morou naquele país. "Posei com umas 40 pessoas, mesmo dizendo que sou do Brasil." Nem os brincos com a bandeira brasileira e as unhas pintadas de verde e amarelo funcionavam como alerta.

"Meus amigos foram me abandonando ao longo da tarde. Não tiveram paciência de me esperar", dizia ela, que pelo menos no apelido tem um quê de internacional. "Me chamam de Tati Gringa. É porque eu namoro muitos estrangeiros. Meu ex-namorado é suíço", afirmava, em frente a um bar cheio de argentinos.


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