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Crítica - Romance

Personagens do escritor tentam fugir da repetição

MANUEL DA COSTA PINTO COLUNISTA DA FOLHA

Contra grandes mentiras de história, pequenas farsas da vida privada. Assim evolui o quinteto de personagens de "A Festa da Insignificância".

Eles se encontram em praças e museus, reúnem-se em apartamentos e coquetéis. Levam uma vida banal, mas não destituída de angústia.

Ocorre que, nessa Paris do bem-estar social, em que pouco sabemos o que cada personagem faz para sobreviver, o mal-estar subjetivo já não tem um quadro coletivo para desafiar com sua insustentável leveza --como ocorria no mais célebre romance de Kundera.

Passada a tormenta do totalitarismo --reduzido ao teatro de marionetes e às anedotas sobre Stálin que Charles apresenta aos amigos--, desaparece a ameaça da aniquilação individual. Ironicamente, ela ressurge na forma mais branda de uma servidão voluntária ao indiferenciado, a um hedonismo em que "a individualidade é uma ilusão".

Seu símbolo jocoso são os umbigos das moças que Alain (candidato a "spalla" do quinteto) contempla na abertura desse livro de estrutura circular. Mais à frente, diante da fila que se forma para uma exposição, ele encontra com Ramon, que comenta: "Olhe para eles! Você acha que, de uma hora para outra, começaram a gostar de Chagall? Estão dispostos a ir a qualquer lugar, a fazer qualquer coisa, apenas para matar o tempo com o qual não sabem o que fazer".

Assim como no minimalismo --cujos acordes obsessivos criam a aflição de não se sair do lugar--, Kundera criou personagens que buscam escapar do apelo à repetição.

De D'Ardelo (que finge estar com câncer) e Caliban (que se passa por paquistanês balbuciando uma língua inexistente) a Alain (que constrói enredos imaginários sobra a mãe que o abandonou), todos querem ganhar a espessura de uma personagem de ficção --última quimera, parece nos dizer Kundera, em tempos de contemplação do próprio umbigo.


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