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Crítica - Romance

Assassinato de Orson Welles é pano de fundo para discutir a arte

'F', de Antônio Xerxenesky, mistura família e ditadura numa trama carregada de elementos cinematográficos

MARIA ESTHER MACIEL ESPECIAL PARA A FOLHA

"F", do gaúcho Antônio Xerxenesky, fisga o leitor logo nas primeiras páginas. Com enredo intrigante e linguagem fluida, o autor compõe uma narrativa em que diferentes planos temporais e espaciais se articulam, lembrando a estrutura de um filme. O que condiz com os ingredientes ficcionais do livro, pautados em grande proporção no mundo do cinema.

Quem conta a história é a jovem Ana, cinéfila e matadora profissional, que recebe a insólita incumbência de assassinar ninguém menos que o diretor Orson Welles.

Brasileira residente em Los Angeles, com passagem por Paris, ela busca fazer de seu ofício de assassina um exercício estético. Não à toa discorre sobre o que é e o que não é arte, valendo-se para isso de diversas referências pop e literárias.

Trata-se de um romance "cult", no qual o escritor mescla elementos policiais, drama familiar, viagens e alucinações, articulando tudo isso ao cenário da ditadura militar brasileira.

Ana escreve seu relato em 1985. Nascida em 1960, filha de pai militar (envolvido com práticas de tortura) e sobrinha de um militante de esquerda, ela aparece como uma típica "filha da ditadura" e que se vê atravessada pelos efeitos dessa vivência.

Se a trama se mostra inverossímil em vários momentos do romance, percebe-se uma deliberada opção do autor por esse caráter "fake".

Isso se justifica não só pelo próprio título "F" --tomado de empréstimo do filme "F for Fake", de Orson Welles-- como também pela narrativa em primeira pessoa, conduzida por uma personagem que oscila entre a lucidez crítica e a alucinação.

Verdade e mentira se misturam o tempo todo na narrativa de Xerxenesky, evidenciando que o F do título deve ser tomado, preferencialmente, como F de "ficção".

Além do entretenimento garantido, o leitor também tem acesso a várias sinopses de filmes de Welles e de outros diretores "cult", comentários sobre música pop dos anos 70 e 80, além de discussões interessantes (sob o ponto de vista não-dogmático de uma jovem do tempo) sobre um período crucial da história política brasileira.

Mesmo que o caráter artificial de algumas passagens possa incomodar o leitor, "F" é um romance que traz uma marca de singularidade para a literatura brasileira.

Considerando que Antônio Xerxenesky tem apenas 30 anos, resta-nos imaginar, finda a leitura de "F", o que ele será capaz de escrever depois.


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