Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Ilustrada

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Mônica Bergamo

Eu também sou da família

Após 14 anos, elenco grava episódio final de 'A Grande Família' com surpresas, como presença de Gloria Pires e Daniel Filho, e velhos hábitos, como piadas de Pedro Cardoso; diretor admite 'certo esgotamento'

No estúdio C da Rede Globo, no Rio, Tony Ramos ficou em silêncio, à cabeceira da mesa de jantar e olhando para baixo. Estava concentrado à espera do áudio de uma das cenas finais do seriado "A Grande Família" --que se encerra no dia 11 de setembro, após 14 anos de exibição.

Por um alto-falante, o ator ouviu a gravação com a participação dos personagens centrais da história, interpretados por Marco Nanini (Lineu), Marieta Severo (Nenê), Pedro Cardoso (Agostinho), Guta Stresser (Bebel), Lúcio Mauro Filho (Tuco) e Evandro Mesquita (Paulão).

Em instantes, o mesmo roteiro, uma conversa durante um almoço em família, ganharia uma segunda versão.

Caracterizado como o Lineu consagrado por Nanini, Tony estava à mesa rodeado por Gloria Pires (Nenê), Lázaro Ramos (Agostinho), Deborah Secco (Bebel), Marcelo Adnet (Tuco) e Alexandre Borges (Paulão). Todos trajados com os devidos figurinos, como constatou o repórter Fabio Brisolla, que teve acesso à gravação.

Aos risos, Lázaro comentou os diálogos do Agostinho original, que reproduziria logo depois. "O Pedro [Cardoso] tinha três falas. Não disse nenhuma delas. Saiu tudo diferente. É maravilhoso! Partindo desse princípio, agora posso fazer o que quiser."

O último episódio de "A Grande Família" teve ainda Luana Piovani como Lurdinha, personagem da atriz Maria Clara Gueiros integrada nesta última temporada.

Daniel Filho foi outro convidado especial. E apareceu em cena como ele mesmo, o célebre diretor da TV Globo que diz a Lineu e seus parentes que a emissora quer retratar suas histórias em um seriado. Para representá-los, escalaria o grande elenco liderado por Tony Ramos e Gloria Pires.

Em uma cena, Daniel Filho citou famosos vilões da TV brasileira como Odete Roitman (Beatriz Segall em "Vale Tudo"), Carminha (Adriana Esteves em "Avenida Brasil") e Félix (Mateus Solano em "Amor à Vida"). Ainda no ensaio, Pedro Cardoso saiu do texto e fez cara de interrogação: "Félix? Quem é Félix?". Os colegas reagiram.

"Pedro, como você não sabe quem é Félix?", perguntou um deles. "Quem é Félix?", repetia o ator, com olhar irônico. "Assim não vai poder renovar contrato com a Globo", acrescentou outro. Guel Arraes, diretor do núcleo da TV Globo responsável por "A Grande Família", concluiu: "Ele sabe, sim, quem é Félix. Está fazendo graça".

Dentro de um vestido justo, com estampa de onça, Deborah Secco ouviu o diretor do programa, Luis Felipe Sá, dizer "Ok, bacana" ao fim da cena. Mesmo assim, seguiu comendo o cozido servido na gravação da cena, às 10h50 da segunda-feira (25).

"Eu realmente como muito, a qualquer hora. Consigo comer um cozido pela manhã e daqui a pouco almoçar. Até faço exercício, mas acho que é genética mesmo. Todo dia, sem exceção, eu como uma panela de brigadeiro", disse Deborah.

Ao fim da gravação da primeira cena com o elenco convidado, Pedro Cardoso adentrou pelo cenário. "Soube que fizeram uma versão afeminada do Agostinho", brincou ele, em uma referência à participação de Lázaro.

A primeira versão de "A Grande Família" foi exibida em outubro de 1972 pela TV Globo. Trazia os atores Jorge Dória como Lineu e Eloísa Mafalda no papel de Nenê. Inspirada em uma série americana feita pela CBS ("All in the Family"), a produção brasileira foi escrita por Max Nunes e Roberto Freire em um primeiro momento. Depois, Oduvaldo Vianna Filho e Armando Costa assumiram a criação dos episódios.

A série saiu do ar em 1975, justamente o ano em que passou a ser transmitida em cores. Vinte e seis anos depois, em 2001, o programa voltou à grade de programação da Globo. Desde a segunda temporada, a nova versão ganhou capítulos inéditos escritos por autores sob a coordenação de Cláudio Paiva.

Por 12 anos, a escritora Adriana Falcão participou da equipe de criação do programa. Ela recorda a irritação inicial: "Escrevia com todo o cuidado, com a preocupação de encontrar a frase exata, e aí vinha o Pedro [Cardoso] e fazia tudo do jeito dele". Ela hoje divide com Mauro Wilson a responsabilidade pela redação final do programa.

Mesmo contrariada, ela reconheceu os méritos do ator. "Percebi que os improvisos dele eram muito bons. O resultado realmente ficava melhor. Por isso, me rendi à realidade, ao talento dele."

No caso de Guta Stresser, o conflito com Pedro Cardoso foi mais explícito. Em junho de 2012, houve uma discussão entre os atores durante uma gravação. Após a briga se tornar pública, ambos disseram que o problema havia sido superado. Na mesma época, o elenco já havia iniciado conversas a respeito do fim da atração com a direção da TV Globo.

Com frequência, nas primeiras temporadas, "A Grande Família" chegava a ultrapassar os 35 pontos de audiência média. Gradativamente, os números caíram. Em 2014, a audiência oscilou entre 20 e 23 pontos.

Atual diretor da atração, Luís Felipe Sá assinalou que, na última década, a queda de audiência atingiu toda a programação das emissoras de TV aberta. "Neste ano, alcançamos audiência próxima à do Jornal Nacional', em algumas vezes maior do que a da novela das sete. Nunca tivemos problemas." Ainda assim, avaliou que chegara a hora de parar. "Tem um certo esgotamento, sim. Não dá para dizer que não tem."

Marieta Severo pontuou que, ao longo dos anos, a ficção de "A Grande Família" espelhou as mudanças do país. "A minha personagem se transformou durante o programa. Abriu um restaurante, virou uma pequena empreendedora. A Nenê retrata a mulher da classe média brasileira", disse a atriz.

Para Pedro Cardoso, a lacuna deixada por "A Grande Família" ganha um peso maior por causa da baixa qualidade da programação dos canais concorrentes. "A TV Globo tem investido na produção audiovisual brasileira com seriedade há muito tempo. Só que as outras emissoras da televisão aberta não fazem o mesmo, e isso é ruim para o país", analisou.

Marco Nanini afirmou que, após quase 500 episódios, era necessário haver um final para a história. "Não dá para esperar todo mundo desligar a TV por não aguentar mais ver aquela gente", disse, com bom humor.

O ator mencionou o público fiel: "A família brasileira tem carinho pela família brasileira. De uma certa forma, a gente entrou nesse pacote".


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página