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Quadrinhos narram busca de escravos por liberdade
Período colonial brasileiro ambienta o livro 'Cumbe', de Marcelo D'Salete
Obra do paulistano reúne quatro contos, intitulados com palavras do vocabulário dos escravos na época
Quais seriam as histórias de liberdade dos escravos na época colonial? Foi com base nessa ideia que o quadrinista Marcelo D'Salete, 34, imaginou os quatro contos do livro de histórias em quadrinhos "Cumbe" (ed. Veneta).
O sonho de ser dono de si é materializado em diferentes histórias de relacionamento, protagonizadas pelos escravos. Do contato amoroso ao fraternal, do convívio coletivo à motivação individual.
"A escravidão foi uma forma brutal de desumanização e distorção das relações entre negros e brancos. Um fato que marcou e marca nossa realidade social até os dias de hoje. Rever esse período, recriar essa história a partir dos fatos que temos hoje, é tentar também repensar o presente", diz D'Salete.
A construção das narrativas veio de pesquisas feitas pelo autor. A palavra que dá título à obra e a um dos contos é fruto desse levantamento. "Cumbe" seria sinônimo de quilombo.
Um glossário no final do livro, com outros 13 verbetes citados nas histórias, traduz os termos ao leitor.
O vocabulário comum à cultura dos escravos intitula também os outros trabalhos do livro: "Calunga" (mar, entre outros significados), "Sumidouro" (poço onde eram jogados escravos rebeldes), "Malungo" (companheiro). Enredos distintos, unidos por diferentes maneiras de encontrar a liberdade.
IDAS E VINDAS NO TEMPO
Outro ponto comum entre as quatro histórias da obra é o estilo narrativo do quadrinista. D'Salete tem uma predileção por vai e vens temporais, transitando de uma determinada situação para outras, anteriores a ela.
Foi um recurso já usado por ele nos dois livros anteriores, "Noite Luz" (Via Lettera, 2008) e "Encruzilhada" (Leya/Barba Negra, 2011).
"Construo as minhas histórias de forma fragmentada. Gosto muito de criar a partir de cenas e de explorar as possibilidades entre cada quadro e momento."
E reflete: "Imagino que talvez essa forma de construção apareça no meu trabalho devido à influência de alguns filmes, diretores de cinema e escritores".
Paulistano, professor da Escola de Aplicação da Universidade de São Paulo, D'Salete planeja reprisar a temática escravocrata num projeto iniciado há oito anos: narrar a história do Quilombo dos Palmares ao longo de 300 páginas. Negro, tem na própria raça uma de suas motivações.
"Minha proposta é recontar esta saga a partir do olhar dos negros e africanos que estavam naquele local, não somente a partir dos principais líderes, mas também de personagens comuns."
"É uma história baseada em fatos históricos, mas quis recontar isso de forma poética e pessoal", explica.