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Ilustrissima

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Imaginação

Cinco poemas de guerra

Cartões postais

MARCHA FORÇADA

Louco quem da terra morto se levanta e de novo se arrasta,e com a dor do nômade movimenta tornozelos e joelhos, e ainda assim se põe a caminho, como se alçado por asas,e as valas o chamam em vão, não tem coragem de ficar,e se você perguntar, por que não? talvez ele respondaque a mulher espera por ele e uma morte mais bonita, mais sábia.Embora o crédulo esteja louco, porque lá sobre os lares há muito apenas voam cinzasa parede da casa desabou, o pé de ameixa se partiu,e de medo é tormentosa a noite da terra natal.Oh, se eu pudesse acreditar: que não é apenas no coração que eu levotudo que ainda vale a pena, e que existe uma casa à qual voltar;se ainda existisse! e como em outros tempos na antiga varanda frescazumbisse a colmeia da paz, enquanto resfriava a geleia de ameixa,e o silêncio do final de verão se banhasse ao sol nos jardins sonolentos,em meio à folhagem frutas pendessem nuas,e Fanni me esperaria loira diante da cerca vermelhae lentamente escreveria sombra a lenta manhã, --mas talvez ainda possa acontecer! A Lua está tão redonda!Não prossiga, amigo, grite comigo! e vou me levantar!Bor, 1944, 15 de setembro.

Cartões-postais

1 Da Bulgária, a palavra espessa e selvagem dos canhões se derrama,

pisoteia o dorso da montanha, depois hesita e cai,

se atropelam homens, animais, carroças e pensamentos,

o caminho se detém gemente, o céu cacheado desliza.

Você está sempre comigo na confusão incessante,

no fundo da minha consciência você brilha eterna imóvel

e muda, como o anjo que contempla o extermínio,

ou o verme fúnebre que devora a árvore apodrecida.

30 de agosto de 1944. entre as montanhas

2 A nove quilômetros daqui ardem

rolos de feno e casas,

e à margem dos pastos sentados mudos

camponeses horrorizados sorvem cachimbos.

Aqui ainda pregueia a água a pequenina pastora que pisa no lago

e bebem nuvens sobre a água debruçadas as ovelhas felpudas.

cservenka, 6 de outubro de 1944

3 Da boca dos bois escorre saliva sangrenta,

os homens todos urinam sangue,

a companhia se detém em novelos malcheirosos selvagens.

Acima de nós sopra a morte tremenda.1

mohács, 24 de outubro de 1944

4 Desabei a seu lado, seu corpo se virou

e já estava teso, como corda, quando se rompe.

Tiro na nuca. -- Assim será também o seu fim, --

sussurrei para mim mesmo, -- continue deitado sereno.

A paciência agora desabrocha em morte. --

Der springt noch auf, -- ouvi acima de mim.

No meu ouvido secava sangue misturado a lama.2

szentkirályszabadja, 31 de outubro de 1944

SOBRE O TEXTO O poeta húngaro Miklós Radnóti (1909-44) foi enviado ao campo de concentração de Bor, na atual Sérvia, durante a Segunda Guerra Mundial. Quando os nazistas recuaram, Radnóti e outros foram obrigados a voltar para a Hungria em uma das marchas forçadas, durante a qual ele foi executado. Os textos acima foram encontrados em um caderno de notas no bolso de seu casaco quando o corpo foi exumado de uma vala comum e reunidos por sua viúva, Fanni Gyarmati (1912-2014).


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