Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Ilustrissima

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Diário de Lisboa- o mapa da cultura

Os tuk-tuks vão a Alfama

Após "Oscar" turístico, a capital apinha-se

ISABEL COUTINHO

A abertura do Cinema Ideal, na rua do Loreto, números 15 e 17, entre o Chiado e o Bairro Alto, a 28 de agosto, foi o acontecimento da "rentrée" lisboeta. O mais antigo cinema de Lisboa --que já se chamou Salão Ideal, Cinema Ideal, Cine Camões e Cine Paraíso-- reabriu no mês em que cumpre 110 anos. Quer ser um cinema de bairro e a alternativa aos cinemas dos centros comerciais.

É uma iniciativa da distribuidora Midas Filmes, de Pedro Borges, e da Casa da Imprensa, dona daquele edifício histórico. Tem projeto arquitetônico de José Neves, Prêmio Secil de Arquitetura 2012, e é fruto de investimento de 500 mil euros, que incluiu o equipamento de projeção e de som. A sala, com plateia e balcão, como antigamente, tem cerca de 200 lugares e haverá uma cafeteria e livraria. A programação tem a particularidade de ser feita pela Associação Cultural Cinema Ideal, 30 pessoas que sabem do assunto, entre os quais realizadores, atores e produtores.

Em exibição está "E Agora? Lembra-me", o premiado documentário de Joaquim Pinto --um diário de um ano de tratamento experimental e o peso de duas décadas de vivência com os vírus HIV e hepatite C, e a história de amor de Joaquim e de Nuno Leonel --premiado em Locarno (Prêmio Especial do Júri e Prêmio da Crítica Internacional) e no DocLisboa (Grande Prêmio em 2013). Também em exibição no Cinema Ideal está um clássico: a versão digital de "Rastros de Ódio" (1956), de John Ford.

Seguir-se-ão mais filmes portugueses entre os quais a esperadíssima adaptação de "Os Maias", de João Botelho (haverá uma versão de três horas).

A invasão de Tuk-tuks

A abertura de um cinema no centro de Lisboa, no ano em que pelo país se assistiu ao encerramento de muitas salas, é sintomática do boom turístico que aconteceu neste verão na cidade.

Considerada pelos World Travel Awards (o Oscar do turismo) o sítio perfeito para escapadelas, Lisboa está na moda. Ruas antigamente abandonadas ganharam vida. Quando no início dos anos 1990 vim morar para Alfama, um dos bairros mais típicos de Lisboa, não havia esta agitação dos tuk-tuks, (veículos de três rodas) importados da Ásia, com turistas divertidos a subir e descer as ruelas ou turistas em fila indiana, em cima de patinetes elétricos Segway.

antiga Zaragata

Na Calçadinha de Santo Estêvão, as escadinhas onde fica o balneário público e a igreja de Santo Estêvão, todos se conheciam. Na rua da Regueira havia muitas vezes zaragatas. Quem subisse a estreita rua de casas pombalinas geminadas admirava-se com papelinhos brancos espalhados pelo chão, fosse de dia ou de noite. Eram restos do intenso tráfico de droga. Se se ouviam assobios, sons agudos a atravessar as ruas estreitas, já se sabia que a polícia entrara no bairro. Avisavam-se uns aos outros, e o bairro protegia os seus.

Em todos estes anos nunca fui assaltada, mas houve épocas em que amigos ficavam só o tempo de jantar e eram assaltados. Os turistas eram avisados para não entrarem no bairro sozinhos nem com câmeras na mão. As peixeiras ainda apregoavam na rua de São Miguel e ainda existia a mercearia da dona São, onde se podia ser surpreendido por um rato a correr entre os caixotes de legumes.

Disneylândia pombalina

Abriu o Museu do Fado, as tascas e as casas de fado prosperaram, há esplanadas, os paquistaneses tomaram conta das mercearias do bairro, há barbearias fashion e lojas a fazer de conta que são gourmet, ginjinha, souvenirs de galos de Barcelos, sardinhas em lata e t-shirts com Fernando Pessoa. Há novos espaços como o das austríacas, com strudel, e o dos italianos, com pizzas à fatia.

Ouve-se constantemente o barulho das rodinhas das malas dos turistas --que passaram a ser os vizinhos que não se conhecem--, a subir e a descer as irregulares calçadas. Casa sim, casa não há um letreiro "aluga-se". Em 2015 deverá estar pronto o novo terminal de cruzeiros em Santa Apolônia, com capacidade para fazer entrar em Lisboa 1 milhão de turistas em barco por ano. Há quem receie que este turismo "massificado" esteja a transformar Lisboa e os bairros históricos num parque de diversões, e Alfama a perder a raça.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página