Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Ilustrissima

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Arquivo aberto - memórias que viram histórias

Entre o Stone e o Led Zeppelin

Salvador, 1996

MARGARETH MENEZES

Muitas coisas na minha carreira aconteceram de maneira inusitada, até mesmo a minha entrada no universo da arte. Desde a minha família --em que meu avô, autodidata, tocava violão com o instrumento deitado no colo, como os havaianos--, até meu nascimento, tudo se deu de maneira muito singular. A paquera de meu pai com minha mãe, por exemplo, aconteceu por meio de uma música que ele cantava sempre que ela aparecia na mercearia onde ele trabalhava.

Das muitas histórias que enfeitam a minha suada vida de artista, quero recordar uma que ocorreu há quase 20 anos. Em 1996, criamos em Salvador o Festival Bahia com H --uma iniciativa da minha produtora na época, a Central de Produções, então dirigida pela amiga Jaqueline Azevedo. O evento tinha uma dinâmica muito legal, propondo cruzamentos de shows de artistas baianos e artistas de fora da Bahia, e aconteceu durante três meses naquele verão, fazendo bastante sucesso.

Naquela noite, que viria a se tornar antológica, eu faria a primeira parte do show --depois seria a vez da querida Zélia Duncan.

Lícia Fábio, uma das maiores promoters do Brasil, me ligou durante o dia com a notícia: o Ron Wood, guitarrista dos Rolling Stones, estava em Salvador com sua família e queria ir ao show. A princípio fiquei meio aérea, sem saber se era isso mesmo que estava ouvindo. Respondi que seria uma grande honra, ainda sem dar o real peso ao significado daquele fato. A ficha não havia caído.

A proporção daquilo só se apresentou mesmo para mim quando lembrei que a lenda Jimmy Page, o magnífico guitarrista da banda Led Zeppelin, que já era meu amigo e estava na Bahia, também iria ao show. Foi a partir daí que comecei a tremer, e toda equipe entrou num estado de euforia. Receberíamos dois reis da música mundial!

Ron Wood e Jimmy Page se encontraram no meu show e foi uma verdadeira onda. Eles não tocaram --me faltou o "queixo", como se diz na Bahia, para pedir a famosa canja--, mas conversaram muito, e eu soube que Page ficou bem surpreso com aquele encontro.

Depois de todo o bochicho, eu os cumprimentei e marquei uma visita a Ron Wood e sua família no hotel em que estavam hospedados, no Alto de Ondina.

Com o Jimmy, eu ainda teria muitos momentos. Passeamos de barco, preparamos uma superfeijoada para ele e, fazendo jus ao meu nome meio inglês, até fui visitá-lo em Londres (na casa que ele comprou do guru Maharishi Mahesh Yogi, referência espiritual do movimento hippie nos anos 60) e fora de Londres (em sua outra casa, às margens do rio Tâmisa).

Wood, porém, eu não veria mais depois da ida dele à Bahia. Fui até o hotel com minha amiga gaúcha, roqueira e professora de inglês Marília Mattos. Ele nos recebeu muito bem e nos identificamos muito.

A certa altura, Wood pegou uma folha de papel em branco e começou a rabiscar. Estávamos ali envolvidos na conversa e ele, muito observador, me disse que meu olhar estava com uma expressão triste, mas que não me preocupasse: "O amor está chegando", cravou.

Até hoje não sei o porquê daquilo. O que sei é que no final da conversa ganhei um desenho que ele fez ali, na hora, com nanquim e cinzas de cigarro. Um presente muito especial e quase exclusivo --pelo que sei, no Brasil apenas eu e Pelé fomos retratados por ele.

Ainda nesse clima, no dia seguinte levei Ron Wood e a família para passear em Praia do Forte, na fazenda Sapiranga. Ficamos ali, num hotel maravilhoso, na beira da lagoa Aruá, só comendo, pescando e curtindo a vida.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página