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Entrevista - Jan Koum

Integração com Facebook seria ruína do WhatsApp

Criador de aplicativo cita fracassos anteriores para defender que empresas sigam independentes após compra e diz que serviço de voz pode aumentar anuidade, mas não será no curto prazo

ROBERTO DIAS ENVIADO ESPECIAL A BARCELONA

No início da tarde de ontem, ao pé da montanha de Montjuic, um mestre de cerimônias pedia paciência à plateia. "Ele é uma estrela", dizia, para justificar o atraso do convidado. O auditório estava apinhado de representantes de start-ups, num dos vários eventos que acontecem em Barcelona no rastro do Mobile World Congress.

Quem apareceu a seguir foi o príncipe de Astúrias, Felipe de Bourbon, o herdeiro da Coroa espanhola. Entrou e sentou-se na plateia.

A estrela mesmo veio depois: Jan Koum, criador do WhatsApp e novo bilionário americano --há uma semana, vendeu a empresa para o Facebook por US$ 16 bilhões (R$ 37,5 bilhões).

Após festejar seu 38º aniversário na noite anterior, Koum cumpria mais uma etapa da rotina de estrela que viveu nos últimos dias na cidade. Falou sobre seus planos para o aplicativo usado por 465 milhões de pessoas.

Saciou a curiosidade do público pelos detalhes da negociação com Mark Zuckerberg. Foi longamente assediado para fotos e conversas ao sair do palco.

E, numa rara concessão, deu uma entrevista à Folha.

Folha - Os aparelhos móveis que se vestem vão ter um papel na comunicação?

Jan Koum - Sim. Algum tipo de integração com o corpo será um fator. Isso [mostra seu smartphone] só está aqui há cinco anos. Antes deles, havia telefones que não podiam fazer muita coisa. A tecnologia está evoluindo num ritmo muito rápido, por isso é difícil demais prever o que vai acontecer em dez anos.

Vamos ver algum tipo de sistema de texto e voz que faz as duas coisas ao mesmo tempo, intercaladas, a voz virar texto e o texto virar voz?

Isso seria bastante divertido. Eu não tinha pensado nisso. Mas é uma boa ideia.

Os serviços de mensagem mudam a maneira como comunicamos ideias? Porque é diferente até do e-mail, não tem corretor...

As coisas estão mudando num sentido de serem mais rápidas, mais em tempo real. No e-mail, você manda a mensagem, não sabe se a pessoa respondeu. E ainda assim foi possível tanta coisa com e-mail.

A coisa está ficando mais em tempo real, mais pessoal. Do jeito que a tecnologia está indo, vamos ter aquela coisa do "Minority Report", de trocar arquivos. No fim das contas, isso vai tornar a vida das pessoas mais fácil.

Essa coisa toda vai ajudar ou atrapalhar as pessoas a falar corretamente sua língua?

Espero que não [atrapalhe]. As pessoas sempre tiveram preocupações quando novas tecnologias apareceram. Quando surgiu a TV, preocupavam-se porque as crianças estariam vendo TV demais. Preocupavam-se porque as crianças estavam ouvindo rock. Se estavam jogando videogame demais, gastando tempo demais na internet.

Lembro que, 15 anos atrás, as pessoas estavam falando sobre vício em internet. Agora todo mundo está na internet e isso é normal, não é? Há um risco de que a linguagem e a gramática possam evoluir e mudar um pouco. Mas acho que, apenas porque cada tecnologia carrega preocupações e questões, não deveríamos entrar em pânico.

O sr. já falou várias vezes sobre o quanto privacidade é importante, tanto para o sr. pessoalmente quanto para a empresa. Agora o WhatsApp é parte do maior banco de dados de humanos feito. As pessoas deveriam se preocupar com o que fornecem ao app?

Nós não coletamos dos nossos usuários nenhuma informação que seja personalizada. Não sabemos seu nome, sua idade, seu sexo, onde vive, seu e-mail, não sabemos onde trabalha nem o que comprou, não sabemos seu cartão de crédito. Se você nos paga, toda a transação é pelo Google ou pela Apple.

E não guardamos suas mensagens. Elas são enviadas para o seu celular. Nós sabemos muito pouco sobre nossos usuários. Tudo o que sabemos é o seu número de celular e quem, dos seus amigos, usa WhatsApp.

É importante que as pessoas entendam que, em vez de enlouquecerem dizendo "meu Deus, o WhatsApp é parceiro do Facebook", tenham uma abordagem mais simples. O que isso significa?

1 - não retemos nenhum dado que você nos dá; 2 - não temos planos de mudar isso. O WhatsApp vai continuar operando da maneira que tem operado.

Todo o motivo para essa parceria é para o WhatsApp continuar a crescer. Queremos que ele chegue a 2 bilhões de usuários. E a maneira é continuar a fazer o que você tem feito. Se nós mudarmos, não teremos tanto sucesso.

O que deveria ser feito em relação à crescente preocupação com privacidade?

Como empresa, temos assistido a isso do lado de fora do campo. Não estivemos envolvidos. Em geral, eu tenho visões políticas muito libertárias. Penso que o governo deveria ser muito pequeno e não se meter na vida das pessoas. Na minha opinião, esse não é um debate tecnológico. Esse é um debate político.

Então discutiria isso com as pessoas dentro da perspectiva política e perceberia que esse é um exemplo de como o governo tem sido grande demais. É um exemplo de como o governo se coloca como obstáculo, no caminho do progresso, e temos que tirá-lo daí.

No passado, o sr. disse que, quando a publicidade está envolvida, o usuário é o produto. O sr. acredita que o Facebook tem 1 bilhão de produtos?

O Facebook agora fortaleceu seu negócios, porque conta com dois caminhos de receita. Eles têm um canal de renda na publicidade e outro canal das assinaturas via mobile [no WhatsApp]. No geral, isso faz do Facebook uma empresa mais forte, que pode ser construída para o longo prazo. Olhe para as grandes companhias do século passado, como a General Electric. Ela diversificou suas unidades de negócios para fazer coisas diferentes, mas todas contribuem para uma grande empresa e uma grande causa. É a mesma coisa aqui.

Vocês farão algum tipo de integração entre ferramentas do WhatsApp e do Facebook?

Não temos planos de fazer nenhum tipo de integração. Vão ser muito minimalistas. A razão para isso é simples: temos um time de engenharia muito pequeno [a equipe inteira do WhatsApp hoje é de 55 pessoas]. Integrações são destruidoras de valor nas aquisições. Eu já vi integração do GeoCities, do Flickr, de Altavista, todas essas companhias tentaram se integrar e falharam, falharam e falharam. Tanto eu quanto Mark acreditamos que, quando você começa a integrar, é quando tudo quebra.

Vocês vão cobrar mais com o serviço de voz [que será lançado no próximo trimestre; a anualidade é de US$ 0,99]?

É uma possibilidade. Ainda não discutimos de verdade. Seria categórico demais eu dizer que não. Mas não temos planos de cobrar mais agora. Pode ser uma possibilidade no futuro. Você sabe, a moeda muda, há inflação, vamos ter de contratar mais gente, obviamente.

"Não temos planos de nenhuma integração. Vão ser minimalistas. Integrações são destruidoras de valor nas aquisições. Eu já vi integração do GeoCities, do Flickr, de Altavista, todas essas companhias tentaram se integrar e falharam, falharam e falharam. Tanto eu quanto Mark [Zuckerberg] acreditamos que, quando você começa a integrar, é quando tudo quebra. Nosso objetivo é não ter integração"


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