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Nizan Guanaes

Francisco, 1

Bergoglio já é um símbolo do executivo moderno e, sem nenhum demérito nisso, um exímio homem de marketing

Jorge Mario Bergoglio, no próprio dia de sua transformação em papa Francisco, mostrou ao que veio. Em 24 horas, com foco, simplicidade e comunicação, desemparedou a Igreja Católica num dos momentos mais difíceis de sua história.

Um ano depois, segue o caminho da modernização, conquistando força dentro e fora da igreja para realizar a tarefa monumental que se impôs.

É uma das grandes lições em curso do management mundial. Um processo público de transformação de uma das maiores, mais importantes e mais veneradas instituições do planeta, com cerca de 1,2 bilhão de fiéis (o mesmo número de usuários do Facebook).

Azarão no conclave que o elegeu papa, Francisco não fez pesquisas nem testes para adotar a nova linha que quer dar à igreja. Foi intuitivo, consultou a alma. Como toda grande lição de gestão, esta é também uma grande lição de marketing.

Antes mesmo de aparecer na sacada do Vaticano como papa, ele recusou as vestes rebuscadas e optou pela simplicidade. Encontrou sua mensagem no DNA da igreja e usa todos os recursos do marketing para transmiti-la.

Mudou das vestes ao discurso, dos sapatos à postura, do carro à moradia. Veio anunciado por um sinal de comunicação ancestral, a fumaça branca, mas, ao completar seu primeiro ano papal, usou o Twitter para dizer aos seus mais de 3,5 milhões de seguidores: "Por favor, rezem por mim".

Francisco sabe do enorme desafio pela frente e usa a comunica- ção 360 graus, desde o primeiro dia, para explicar sua missão e conquistar apoio.

Começou pelo nome. Francisco. Uma palavra rica de significados num mundo carente de significados, um freio de arrumação não só na Igreja Católica mas na sociedade a quem deve guiar.

E não adianta só trocar os sapatos vermelhos da Prada por sapatos pretos mais simples, isso precisa aparecer. Não adianta só trocar o papamóvel luxuoso por um sedã popular usado pela classe média global, é preciso divulgá-lo. Afinal, comunicar sempre foi o papel da igreja. Para isso foram escritos o Velho e o Novo Testamento. Jesus disse aos apóstolos: "Ide e anunciai o Evangelho".

A mídia adora Francisco, especialmente a americana. Foi o primeiro papa na capa da revista "Rolling Stone", escolhido o homem mais elegante do mundo pela "Esquire" e eleito Pessoa do Ano pela "Time", nesta última derrotando o espião-delator Edward Snowden, o que levou alguns cínicos a dizer que a revista optou pela figura capaz de vender o maior número de exemplares, dada a enorme popularidade de Francisco --inclusive entre não católicos.

É nesse mundo cínico, midiático e ultraescrutinado que Francis- co conduz a igreja. Um mundo segmentado, com clivagens cada vez mais distintas da tradição católi- ca. Um mundo saturado de apelos e estímulos. Não é mais o mundo da fé, mas o mundo dos registros, no qual, como definiu um dos fundadores do Google, é impossível apagar a história.

Nessa conjuntura terrena e movediça, Francisco opera seus milagres. Tocando sua trombeta no Twitter e tirando "selfies" na praça São Pedro, reúne forças para levar a igreja de volta ao centro e minar tradições rígidas que afastam alguns dos melhores fiéis.

Quando pediram a Francisco que se posicionasse sobre o homossexualismo, respondeu com um já célebre: "Quem sou eu para julgar?".

Em um ano, sustentando discurso com prática, o papa convocou discussões sobre divórcio, uso de anticoncepcionais, união gay e métodos de contracepção; criou comissão sobre o abuso sexual de menores; adotou medidas para aumentar a transparência e a eficiência das finanças do Vaticano.

Como líder exemplar, age conectado aos anseios e ansiedades de seu rebanho, ou, em linguagem corporativa, de seus "stakeholders".

Por isso mesmo, Bergoglio já é um símbolo do executivo moderno e, sem nenhum demérito nisso, muito pelo contrário, um exímio homem de marketing. Transformou de forma fulminante a imagem de uma instituição ancestral, transportando-a dos palácios do Vaticano para o meio da rua.

Como todo bom executivo, ele sabe que é do chão da fábrica que se sustenta uma organização.


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