Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Mercado

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Marcelo Miterhof

Bola pra frente

As críticas aos "campeões nacionais" se baseiam em clichês do que seria uma política industrial "moderna"

Participei do seminário "A indústria e o desenvolvimento produtivo no Brasil" realizado na semana passada na FGV-SP. A mesa que fiz parte tratou da avaliação de instrumentos da política industrial recente.

Destaco hoje um tema que tem sido muito evocado e pouco compreendido, a dita "política de campeões nacionais", que se refere às grandes operações de renda variável feitas pelo BNDES nos últimos anos, predominantemente em setores de commodities.

São dois os tipos mais comuns de críticas. Um é que a política industrial deveria mirar o apoio a setores na fronteira tecnológica. Outro é que teria sido o BNDES (e não o mercado) quem escolheu os grupos bem sucedidos.

O curioso é que essas críticas apontam em direções opostas. A primeira condena a falta de ativismo e ousadia do Estado. A segunda, seu excesso. O entendimento das motivações que pautaram a ação do BNDES ajuda a explicar tal contradição.

De início, vale notar que há décadas o banco participa de operações de fusões e aquisições, de acordo com as oportunidades de mercado e as prioridades do governo. Não há subsídios nelas. Os recursos provêm dos lucros da BNDESPar e a precificação é feita em bases de mercado.

O apoio via participação no capital é apropriado quando uma empresa tem projetos arriscados, mas de grande chance de lucro. O BNDES se diferencia dos grandes investidores privados no Brasil por mirar um horizonte de retorno mais longo, frequentemente uma década, e por considerar aspectos não estritamente financeiros.

A novidade recente foi o objetivo de internacionalizar grupos brasileiros. Um parêntesis: foram avaliadas propostas vindas do mercado, tendo ocorrido apoio a grupos concorrentes. Não houve "escolha de vencedor".

O diagnóstico da política industrial era que o Brasil, mesmo nos setores que tem alta competitividade, carecia de grupos globais. A crise financeira internacional ofereceu a chance de mudar o quadro: consolidar capitais internamente para buscar no exterior firmas com valores depreciados e disponíveis para serem adquiridas, permitindo abrir mercados em países ricos.

A internacionalização é sem dúvida desejável, pois cria novos espaços para obtenção de lucros, expõe os grupos nacionais à competição global e enobrece sua atuação, desenvolvendo as atividades corporativas centrais (inovação, logística, marketing etc).

A decisão de investir também se baseou na identificação de oportunidades de valorização das empresas, como a flexibilização de barreiras comerciais não tarifárias. Em carnes, por exemplo, a diversificação proteica (atuar com boi, frango e porco) mitigaria a vulnerabilidade a mudanças do consumo e a elevação da participação de produtos processados permitiria ampliar o valor agregado.

É claro que esse salto empresarial não ocorre de imediato e nem sem percalços, por exemplo em razão das dificuldades de se fazer integrações produtivas complexas. Houve ainda (poucas) perdas, caso do frigorífico Independência. Porém, a sua participação na carteira da BNDESPar era de menos de 0,5%.

A referida contradição das críticas aos "campeões nacionais" ocorre porque elas se baseiam em clichês do que seria uma política industrial "moderna".

Ora criticam a falta de inovação quando uma iniciativa se preocupa com a sustentabilidade financeira, ora a falta de parcimônia ("os incentivos devem ser decrescentes e limitados no tempo") quando tem um objetivo desafiador. É comum até dar a Coreia como exemplo de uso comedido de subsídios, o que chega a ser divertido!

No mundo real, é preciso ambição, foco, exposição à competição global, entre outras coisas. Mas também paciência e pragmatismo.

O BNDES opera a partir do capitalismo brasileiro existente, apoiando sua evolução. O suporte à internacionalização em commodities foi uma etapa disso.

Porém é preciso olhar para frente. Por isso, a atuação da BNDESPar também tem envolvido o desenvolvimento da indústria de fundos de investimento em empresas tecnológicas e a participação em grupos privados que atuam em concessões de infraestrutura.

É preciso mais para que o capitalismo brasileiro "cresça e apareça", desenvolvendo competências tecnológicas e empresariais em setores inovadores. Para isso, além de financiamento, é preciso articular outros instrumentos: demanda, P&D, câmbio etc. A crítica é menos pelo que foi feito e mais pelo que ainda está por fazer.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página