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Endividado prefere cortar no alimento

Consumidor busca alternativas para reduzir gasto e leva varejo e indústria a estudar o impacto do endividamento

Xampus e hidratantes sofrem menos porque brasileiro quer manter pequenos luxo mesmo em períodos de crise

JOANA CUNHA DE SÃO PAULO

Gerente de um restaurante em São Paulo, Maria Freitas, 33, entrou no financiamento de um apartamento há três anos. O namorado acabava de mudar de emprego e o salário de ambos daria para pagar as contas com sobra.

O avanço da inflação, no entanto, transformou o cenário. Hoje, ainda comprometida com a prestação do imóvel, ela já enxugou o vestuário, o lazer e agora sobrou para o supermercado.

"Começamos a equilibrar pesquisando preço, indo no atacado e reduzindo a frequência das compras", diz.

Preocupados com a intensidade com que o gasto de seus clientes se retrai diante do compromisso com a parcela do carro ou da casa, os fabricantes e supermercadistas começam a estudar mais a fundo os reflexos do endividamento do consumidor em seus negócios.

O imóvel é o tipo de dívida que mais atrapalha o orçamento destinado ao supermercado. O gasto com o abastecimento do lar com comida, bebida e higiene pode ser reduzido em até 25% quando a renda do consumidor está comprometida com a parcela da casa própria, segundo pesquisa do instituto Nielsen.

Na compra de veículos, o reflexo é uma queda de 17%, ainda conforme o levantamento, realizado com uma amostra de mais de 8.200 lares visitados em 2013.

"Não fazíamos esse estudo antes. Se pensarmos em 2010, quando tudo ia bem e as famílias contraíam despesas com euforia, ainda não havia impacto sobre o abastecimento do lar", diz Olegário Araújo, diretor do Nielsen.

Para Sussumu Honda, presidente do conselho consultivo da Associação Brasileira de Supermercados, o atual cenário de inflação alta, baixo crescimento e piora nos dados do emprego leva o mercado a olhar com lupa os indicadores de endividamento e a demandar estudos ligados ao consumo doméstico.

Trata-se de um receio que não tinha tamanha relevância poucos anos atrás, quando o varejo crescia quase 6% em volume de vendas em 2010, mas ganhou atenção à medida que as vendas perderam força, chegando a uma queda de 0,4% em 2013.

"Houve um processo de crescimento em 2010 em que o consumidor se endividava mais, mas ganhava mais dinheiro. E a inflação não corroía a renda como agora", diz Renato Meirelles, presidente do instituto Data Popular.

Segundo Araújo, o comportamento do cliente que quer economizar é imprevisível. Um consumidor pode optar pelo macarrão barato para não abrir mão de levar o suco da marca mais cara, enquanto outro pode preferir a bebida barata para não renunciar ao macarrão da marca premium.

"O consumidor não deixou de comer, mas procura alternativas. A recomendação para o varejista agora é manter diversas faixas de preços do mesmo produto nas gôndolas para que o cliente possa escolher entre o premium, o médio e o baixo", diz.

REFLEXO NOS GASTOS

O reflexo do comprometimento da renda com algum tipo de dívida é a queda de 17% nos gastos com alimentos. A parcela do orçamento destinada a bebidas também cai em torno de 15%. Os produtos de limpeza sofrem 13%.

Os itens de higiene e beleza são exceção, com impacto mais leve (-8%). Xampus e hidratantes representam o pequeno luxo em tempos de crise, o que permite que a categoria continue crescendo ou caia pouco, mesmo no cenário econômico ruim.

"Existe uma mudança crescente do patamar de inadimplência nos últimos anos. A participação do crediário na renda das famílias subiu de 19,6% no terceiro trimestre de 2013 para 25,8% no segundo deste ano. A taxa de juros subiu e a massa de rendimentos cresceu menos", diz o Claudio Felisoni, presidente do conselho do Provar (programa de varejo) da FIA.

Para o economista Guilherme Dietze, da FecomercioSP, a imprevisibilidade econômica atual também afeta. Em junho, o índice de intenção de consumo caiu em São Paulo pelo quarto mês seguido, atingindo recorde negativo na série de pesquisas iniciada em 2009.

"Quando a classe C crescia, a inflação não estava acelerada como hoje. Queda de IPI para carro e linha branca, além de taxa de juros mais adequada e forte oferta de crédito, contribuíram para elevar o endividamento de 2004 em diante, com o auge em 2010 e 2011. Depois disso, a falta de investimento adequado na última década começou a fazer falta", diz.


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