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Entrevista Peter Evans

Estado deve orientar investimento privado em áreas importantes

Brasilianista afirma que é fundamental ter um projeto nacional e defende inclusão de sindicatos e intelectuais na discussão

ELEONORA DE LUCENA DE SÃO PAULO

Para desemperrar o crescimento, a presidente Dilma Rousseff convoca empresários e pede investimentos.

Na visão do brasilianista Peter Evans, a iniciativa é insuficiente: a lógica empresarial, voltada para os resultados financeiros, é outra.

Evans, 68, fez estudos clássicos sobre a relação Estado/empresas no Brasil. Morou no Brasil nos anos 1970, deu aulas na UnB e atuou no Cebrap nos anos 1980.

Seu "A Tríplice Aliança" (1979) dissecou o tripé do modelo brasileiro de então, que reunia capitais estatais, nacionais e estrangeiros.

Professor emérito da Universidade da Califórnia, em Berkeley, ele defende que o governo amplie sua aliança em torno de um projeto nacional, incluindo organizações sindicais, associações e intelectuais. Leia trechos da entrevista concedida por telefone de Nova York.

Folha - Em "A Tríplice Aliança", o sr. estudou a articulação entre Estado e capitais nacionais e estrangeiros na constituição do modelo brasileiro. Essa fórmula daria certo hoje?
Peter Evans - O setor privado não vai investir nos ramos mais importantes sem alguma disciplina e coordenação por parte do Estado. O Estado pode desempenhar papel importante, incentivando o capital privado a investir nas novas fronteiras de produção. A racionalidade do retorno privado não é suficiente para canalizar os investimentos nas áreas de maior risco.

Qual o papel dos empresários?
A famosa burguesia nacional quase não existe. O capital tem ligações muito mais globais do que na década de 1970. Ao mesmo tempo, o papel do setor financeiro se tornou mais dominante.
É muito mais difícil para o Estado construir hoje uma aliança local em torno de um projeto nacional. Os projetos do capital são mais orientados para os retornos globais.
É por isso que o Estado deve fazer uma aliança muito mais ampla do que a velha tríplice aliança. Deve incluir uma faixa muito maior da sociedade civil e das pessoas menos privilegiadas. São elas que têm o interesse fundamental nesses investimentos, nas capacidades humanas.

O sr. pesquisou os protagonistas do setor empresarial brasileiro nos anos 1970. O Brasil não tem empresários poderosos hoje?
Existem capitalistas brasileiros muito poderosos globalmente. Mas a diferença entre a visão do capital brasileiro e a do sediado em Nova York está cada vez menor.

Há ainda espaço para um projeto nacional?
É fundamental ter um projeto nacional. A transformação da economia política global problematiza a construção de projetos nacionais. No mundo atual, projeto nacional exige mais vontade e esforço político. As elites privadas que controlam o poder econômico estão cada vez mais atraídas pelas estratégias globais -até nos casos em que essas estratégias globais não beneficiam os interesses gerais da cidadania.
Os cidadãos comuns estão mais enraizados na comunidade nacional. Logo, a organização e a mobilização dos interesses coletivos desses cidadãos são cada vez mais fundamentais para a construção de um projeto nacional.

Por isso é mais difícil hoje desenhar um projeto assim?
Desenhar um projeto efetivo depende da participação da população. A época em que a elite desenhava um projeto por si, sem participação maior da população, já era.

No passado, bastava reunir empresários no escritório do ministro da Fazenda.
O que aconteceu na época da ditadura dependeu de investimentos anteriores, de um projeto nacional que já tinha se desenvolvido. Não é correto atribuir uma influência maior desse período em si sobre a grande trajetória brasileira. Naquele tempo se desenvolveu um projeto da elite para os interesses da elite. Um projeto só da elite não funciona a longo prazo. É uma das razões que explicam por que a ditadura não conseguiu sobreviver.

Como seriam os novos pilares para o desenvolvimento?
Tem que se fundar na ideia de que o desenvolvimento é principalmente o das capacidades humanas, que precisa alcançar uma faixa bastante ampla da população.

Isso significa incluir, por exemplo, sindicatos, associações, cientistas na discussão do projeto nacional?
Exatamente.

Qual o papel do Estado na definição desses investimentos?
É fundamental. A racionalidade do setor privado é muito mais facilmente orientada pelo investimento em máquinas que nas capacidades humanas. Porque o retorno do investimento nas máquinas vai para o dono delas. Mas o retorno do investimento nas capacidades humanas vai para os indivíduos. Mais importante: vai para a sociedade.

A presidente está se reunindo com empresários para pedir mais investimentos. Essa é uma estratégia adequada?
Não é possível mudar o raciocínio dos empresários simplesmente pedindo. O raciocínio do capital é cada vez menos um raciocínio de projeto nacional. O raciocínio global do capital é cada vez mais direcionado a encontrar possibilidades de obtenção de retornos financeiros. Pedir não funciona nem no Brasil nem nos EUA.

O que o governo deveria fazer?
Os investimentos fundamentais para o desenvolvimento, na educação e na saúde -que geram emprego e renda. O setor público tem de ser visto como o centro-chave do processo.

Leia a íntegra da entrevista
folha.com/no1243276


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