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Nos EUA, contratação é por hora e limpeza é superficial

Empresas fazem faxina de 2,5 horas por R$ 199; imigrantes são exploradas

Primeira-dama Michelle Obama diz fazer questão de que suas filhas arrumem a cama e lavem a roupa

LUCIANA COELHO DE WASHINGTON

Quando voltou ao Brasil em 2011, após mais de meia década no exterior, a consultora em sustentabilidade Helena*, 35, decidiu que teria faxineira três vezes na semana.

Com uma filha de menos de um ano e a agenda do marido, executivo de multinacional, mantendo-o parte do tempo longe da nova casa da família, no Rio, ela achou que "ter ajuda" três vezes por semana, como funcionara logo que a bebê nascera, na Suíça, seria um luxo necessário.

O arranjo durou pouco. A consultora, que no exterior se virava com faxineira em casa poucas horas por semana -ou nem isso-, logo notou que precisaria de alguém em tempo integral e de uma babá.

"Queria fazer como era na Suíça, mas acabei me rendendo. Isso porque o estilo de vida [no Brasil] é totalmente diferente, as pessoas já subentendem que você tem funcionários em casa ao marcar compromissos", afirma.

"Eu levava minha filha a festinhas e cuidava dela, enquanto outras mães ficavam tomando café. Há uma questão social", diz Helena, que recorreu à babá como braço direito, mas resiste em delegar os cuidados com a filha quando está por perto.

TRÂNSITO E HORÁRIOS

Há também a questão logística, lembra: o trânsito da capital fluminense (e de outras grandes cidades no Brasil) e as extensas horas de trabalho exigidas por empresas brasileiras, comparadas à flexibilidade europeia, tornavam a dupla jornada como mãe de um bebê e profissional responsável, na maioria dos dias, incongruentes.

O choque de realidade de Helena é comum em uma classe mais alta com vivência no exterior, em que passar o aspirador na própria casa e lavar a louça e as roupas é algo perfeitamente natural.

Recentemente, Michelle Obama, a primeira-dama dos EUA, disse fazer questão de que suas filhas arrumassem as próprias camas e que a mais velha, Malia, de 14 anos, lavasse suas roupas nas máquinas da Casa Branca.

A hora de uma faxineira em Washington não sai por menos de US$ 20 (R$ 39,50), e o arranjo convencional é que a faxina se limite a três ou quatro horas semanais. O valor é 2,5 vezes o do salário mínimo estabelecido pelo governo distrital, de US$ 8,25/hora, acima dos US$ 7,25 fixados pela lei federal.

FIRMAS DE LIMPEZA

Como a contratação por hora virou praxe, outra saída são as firmas de limpeza.

A MaidPro, franquia que se estende por 33 Estados, atendeu ao pedido de orçamento da Folha em dez minutos: a primeira limpeza de uma casa de 80 metros quadrados com dois moradores e sem animais custaria US$ 199, e as subsequentes, semanais, US$ 80, incluindo produtos de limpeza. Duração do trabalho? Duas horas e meia, com duas funcionárias.

A realidade do nordeste americano, uma região mais rica, não é a de todo o país, claro. A Aliança dos Trabalhadores Domésticos, associação de classe do setor, afirma que 23% dos empregados da área no país ainda recebem menos do que o salário mínimo. O percentual sobe para aqueles que vivem na casa das famílias contratantes -raridade nos EUA.

FILHAS NA FACULDADE

Ana, 51, recebe da família para a qual trabalha US$ 1.500 líquidos por mês para cuidar de uma casa com quatro pessoas, incluindo duas crianças, e dois animais.

Peruana, ela está nos EUA legalmente, trazida pelos patrões, e diz trabalhar entre 35 e 40 horas por semana (o que daria uma média de US$ 10 por hora).

Mora com os empregadores, que lhe pagam seguro médico -crucial em um país sem assistência gratuita- e todos os impostos.

Com o dinheiro, ela mandou dois dos três filhos à faculdade e agora começa a pensar na aposentadoria.

Ana é exceção. A Pavillon, uma agência nova-iorquina de empregados domésticos em que babás podem ser contratadas a partir de US$ 1.800 ao mês para meio período, advertem sobre a exploração da mão de obra imigrante e sem documentos.

Mas, com a sofisticação do mercado de trabalho no país, as relações são mais profissionais (e as funções, mais claras) do que no Brasil.

Com isso, o mercado da faxina e dos cuidados com crianças acabam atraindo a classe média. Na Pavillion, a maioria das babás completou a faculdade em áreas como pedagogia ou psicologia.

BICO PARA ESTUDANTES

Daniela, hoje consultora de comunicação de um organismo multilateral, lembra que, em sua época de estagiária, chegou a fazer faxinas em dupla com uma amiga para engordar o orçamento.

"Limpávamos tudo tão rápido, porque o padrão de exigência aqui fora é outro. Era esporádico, um bom jeito de conseguirmos dinheiro quando precisávamos", conta.

De fato, o padrão difere, e brasileiros tendem a estranhar a vista grossa dos estrangeiros para poeira nos cantos, janelas sujas e o que se esconde atrás dos móveis.

Estupefato diante da oferta de ajuda numa faxina após uma semana de hospedagem, um casal de escritores de Cambridge, Massachusetts, retorquiu: "Por causa de uma semana? Nós não limpamos tudo toda semana".


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