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TV pública argentina faz série nacionalista sobre Malvinas
SYLVIA COLOMBO DE BUENOS AIRESO jovem operário de uma oficina mecânica sente uma angústia que não consegue explicar. Algo do passado recente o incomoda, mas ele não sabe dizer o que é. O ano é o de 1987, com a Argentina vivendo novamente em uma democracia, e Gustavo Rivero é um ex-combatente da Guerra das Malvinas (1982).
Nos últimos dias do conflito, o rapaz levou um tiro na cabeça que o fez esquecer-se da maior tragédia que viveu no arquipélago. Decide, então, reconstruir o que aconteceu, mas para isso precisa da ajuda dos que combateram com ele. Começa, então, a buscá-los entre os que sobreviveram ao embate e, agora, tentam reintegrar-se à sociedade.
Esse é o mote de "Combatentes", série produzida pelo Incaa (o instituto nacional de cinema argentino) e exibida pela TV Pública. Em 13 capítulos, contará esse verdadeiro trauma nacional argentino, que terminou com a morte de mais de 900 soldados e até hoje constitui um dos mitos nos quais a identidade nacional se apoia.
O roteiro é baseado em relatos de ex-combatentes. A produção tem a qualidade com a qual se distingue o cinema argentino atual. Rodada na Patagônia, recria os ambientes dos combates e o clima inóspito das ilhas.
No episódio de abertura, exibido anteontem, dia do 31º aniversário da invasão, Gustavo começa a buscar os que lutaram com ele na guerra. A ação se passa em vários tempos, antes, durante e depois do conflito. A ênfase está em mostrar como a vida familiar, emocional e material do rapaz se deteriorou.
Os ex-combatentes, rendidos pelo Exército britânico, voltaram à Argentina na desgraça. Devolvidos na calada da noite, foram ignorados pelo governo e pela sociedade, que os via como responsáveis pela derrota. Muitos cometeram suicídio. Vários, até hoje, lutam por seus direitos e carregam sequelas psicológicas da experiência.
Pelo menos no primeiro episódio, a série mostra a tendência de apresentar os combatentes como vítimas.
Nada mais natural uma vez que, de fato, foi a parte mais fraca e a que sofreu de forma mais sangrenta as consequências das decisões políticas do governo militar argentino e das ações da primeira-ministra Margaret Thatcher.
Entretanto, a série corre o risco de cair no melodrama fácil, se ficar só na reconstrução dessas lamúrias pessoais.
Há muito que se esperar da série, a primeira obra de ficção para a TV sobre o tema. Resta aguardar os próximos capítulos.