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Indicação de premiê causa 1ª crise no governo egípcio
Presidência anunciou Mohamed ElBaradei no cargo, mas voltou atrás
Suspeita é que político liberal teria sofrido resistência de partido islâmico que apoiou o golpe contra Mursi
O cargo de premiê causou ontem a primeira desavença no novo governo do Egito, formado após o golpe militar que depôs o presidente Mohammed Mursi na quarta.
O prêmio Nobel da Paz Mohamed ElBaradei, uma das vozes mais influentes da oposição egípcia, chegou a ser anunciado pela mídia oficial como futuro primeiro-ministro. No entanto, por volta da meia-noite do horário local (às 19h, no Brasil), a Presidência negou a nomeação.
Um porta-voz do governo, em comunicado oficial, afirmou que, apesar de ElBaradei ser a "opção lógica", ele ainda não havia sido confirmado. Haveria outras opções para ocupar o posto, todas ainda em consideração.
O anúncio foi recebido com confusão no país, uma vez que já tinha sido noticiada a iminência da posse de ElBaradei. Em seguida, surgiram relatos de que o nome do diplomata havia sido alvo de protesto do partido islâmico Al-Nur, que teria ameaçado retirar seu apoio ao governo instaurado pelo golpe militar.
ElBaradei, ainda a principal aposta ao cargo, é conhecido pela direção da Agência Internacional de Energia Atômica, entidade ligada à ONU, e foi premiado com o Nobel em 2005. Mas o posto de premiê poderia se tornar uma mancha na carreira, associando-o a uma gestão cuja legitimidade é questionada.
Se confirmado, o diplomata integrará o governo do presidente interino Adly Mansur, líder da Suprema Corte Constitucional do Egito. São esperadas eleições parlamentares e presidenciais, ainda sem previsão de data.
A Irmandade Muçulmana, organização de que faz parte o presidente deposto, se recusava ontem a reconhecer ElBaradei como premiê --ou qualquer outra decisão tomada pelo governo, que a organização considera ilegítimo.
À Folha, um porta-voz da Irmandade disse que, uma vez restabelecida a administração Mursi, o diplomata será levado à Justiça.
ElBaradei foi uma das figuras mais importantes no movimento que exigia a organização de eleições antecipadas no Egito. Ele reuniu-se com o Exército, segundo relatos, antes do anúncio oficial da deposição de Mursi. Nas semanas anteriores, tentava convencer a comunidade internacional da necessidade de um novo governo.
O diplomata tornou-se, nos últimos dias, um dos líderes da oposição egípcia. Como ele, o Exército é personagem central na narrativa política das ruas cairotas nos dias seguintes à queda de Mursi.
Os militares, sob a figura de seu líder, o general Abdul Fatah al-Sisi, são hoje heróis nacional para a oposição --e traidores da democracia para os seguidores da Irmandade Muçulmana, à qual Mursi está ligado.
"Não aprovamos Sisi. O que veio dele foi um golpe. Ele conspirou com os partidos políticos e, assim, perdeu a confiança do povo", disse à reportagem Wael Shawqy.
"Ele é um traidor", faz coro Gomaa Badir, 45, nos arredores da mesquita de Rabia al-Adawiya, quartel-general dos militantes islamitas. "Sisi quer tirar nossa única oportunidade de democracia."