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No 1º documento doutrinário, papa prega a descentralização da igreja

Francisco divulga texto em que diz que concentração de poderes no Vaticano é prejudicial

Para pontífice, grupos de bispos em cada país podem ter maior autonomia em aspectos da doutrina católica

REINALDO JOSÉ LOPES COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O Vaticano divulgou ontem a "Evangelii Gaudium" (em português, "a alegria do Evangelho"), primeiro grande documento do pontificado do papa Francisco escrito inteiramente por ele mesmo.

No texto, o pontífice argentino expõe um programa ambicioso para fazer com que, em suas palavras, a igreja "saia de si mesma" e volte a dialogar com o século 21.

Diz preferir uma igreja "ferida e suja, porque esteve nas ruas, a uma igreja doente por estar confinada e agarrada à sua própria segurança."

Antes do texto de ontem, ele havia divulgado uma encíclica sobre fé com seu antecessor, Bento 16, em julho.

Este é seu primeiro trabalho individual. Desde que assumiu a chefia da Igreja Católica, em março, Francisco tem pregado uma igreja mais humilde e aberta.

Em geral, os papas usam as cartas conhecidas como encíclicas quando querem chamar a atenção de seu rebanho para um tema particularmente importante.

A "Evangelii Gaudium" é, em tese, um documento com um pouco menos de peso doutrinário, sendo classificada como "exortação apostólica", mas o tom utilizado por Francisco não deixa dúvidas sobre o peso que deseja dar.

O objetivo de Francisco é apontar caminhos para a chamada "nova evangelização" --o que significa tanto atrair quem ainda não é cristão para o catolicismo quanto, principalmente, fazer com que os fiéis não praticantes, distantes ou mesmo descrentes voltem para a igreja. Para isso, o papa aposta na dimensão local, declarando que é preciso "descentralizar a igreja".

"Uma centralização excessiva, em vez de ajudar, complica a vida da igreja e sua atribuição missionária", diz, acrescentando que o papado é incapaz de dar todas as respostas no mundo de hoje.

Sem entrar em detalhes, ele defende inclusive que as conferências de bispos de cada país possam ter mais autonomia em relação ao Vaticano, inclusive no aspecto doutrinário.

A julgar por outras declarações do pontífice, isso poderia significar que os bispos locais teriam mais liberdade para avaliar se teólogos ou padres infringiram ensinamentos da igreja ou para decidir sobre como lidar com fiéis divorciados.

'NÃO MATAR'

Francisco criticou o hábito de transformar a fé numa lista de dogmas e de proibições --não porque planeje alterar a proibição à ordenação de mulheres ou aborto, por exemplo, mas porque, segundo ele, esses temas não são o centro da crença cristã.

Emprestando a linguagem dos antigos profetas israelitas, condenou com violência o que define como a "globalização da indiferença" e reafirmou a "opção preferencial pelos pobres", ideia cara aos teólogos latino-americanos dos anos 1960 e 1970.

"Assim como o mandamento de não matar' impõe um limite claro para assegurar o valor da vida humana, hoje devemos dizer não a uma economia da exclusão e da falta de equidade'. Essa economia mata", escreve.

O pesquisador italiano Massimo Faggioli, historiador da igreja que trabalha na Universidade St. Thomas (EUA), chamou a atenção para outro aspecto importante do documento: a quantidade de citações aos textos do papa Paulo 6º (1897-1978), responsável por idealizar e colocar em prática a maior parte das reformas que renovaram o catolicismo a partir do Concílio Vaticano 2º, nos anos 1960.

A "Evangelii Gaudium" também tem boas chances de marcar época como a mais importante declaração de um papa em favor da ética ambiental --o que, aliás, é o esperado quando se trata de um pontífice que decidiu emprestar seu nome do "santo ecológico" Francisco de Assis.

Citando um documento de bispos das Filipinas sobre a destruição ambiental em seu país (um dos mais ricos em biodiversidade do mundo), Francisco comparou a fragilidade de outras formas de vida à dos seres humanos em situação de exclusão.


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