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Mercado em cima da hora
OMC anuncia o primeiro acordo global de sua história
Modesto, pacote representa menos de 10% do previsto na Rodada Doha
Órgão dribla resistência de Cuba e divergências entre EUA e Índia; promessa é pôr US$ 1 tri no comércio mundial
Os ministros de 159 países concluíram ontem em conferência em Bali, na Indonésia, o primeiro acordo comercial global em quase 20 anos.
É um pacote modesto quando comparado com as ambições iniciais da Rodada Doha e abrange menos de 10% do que estava previsto. Ainda assim, representa um fôlego importante para a credibilidade da OMC (Organização Mundial do Comércio).
O acordo só saiu após uma maratona de quase seis dias de negociações, que se estendeu pelas madrugadas, conduzida pelo diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo.
Com três meses e meio no cargo, o brasileiro deu um novo ritmo para a entidade e viabilizou o acordo.
"Pela primeira vez na história, a OMC entregou. Estamos de volta", disse Azevêdo, que se emocionou na cerimônia de encerramento e foi aplaudido.
É o primeiro acordo da história da OMC, criada em 2001, em substituição ao Acordo Geral de Tarifas e Comércio (Gatt, na sigla em inglês). O acordo comercial global anterior havia sido a Rodada Uruguai, concluída em 1994.
A OMC está sob forte pressão, enfrentando a concorrência dos mega-acordos regionais em negociação pelos Estados Unidos com a União Europeia e com os países da Ásia.
O pacote da Conferência Ministerial de Bali contém dez textos, divididos em três grandes temas: desburocratização do comércio, agricultura e promoção do desenvolvimento dos países pobres.
Segundo a Câmara Internacional de Comércio, o acordo pode gerar um incremento do comércio global de US$ 1 trilhão, reduzindo entre 10% e 15% os custos de transação entre as empresas, e criar 21 milhões de empregos no planeta.
CUBA CEDE
Cuba, com o apoio de Venezuela, Bolívia e Nicarágua, quase colocou tudo a perder ao insistir que não era possível discutir facilitação do comércio global enquanto os EUA mantêm o embargo contra o país. Na OMC, os acordos só são aprovados por consenso e um país pode bloquear tudo. Mas, após atrair as atenções e enfrentar de frente os americanos, a ilha acabou cedendo.
O grande duelo do acordo foi entre Índia e EUA sobre os programas de segurança alimentar dos países pobres.
O governo indiano enfrenta eleições em quatro meses e não poderia "abandonar" 600 milhões de pequenos produtores rurais que dependem da compra de arroz e grãos pelo Estado.
Já os EUA queriam garantias de que os programas não se tornariam um "cheque em branco" para subsidiar.
Os indianos, que resistiram às pressões internacionais, venceram o embate com os americanos.
A cláusula de paz --espécie de "trégua" para que os programas de segurança alimentar já existentes das nações em desenvolvimento não sejam questionados na OMC-- vai durar até que os países cheguem a uma solução permanente, a ser negociada nos próximos quatro anos.
Os EUA, no entanto, conseguiram outras vitórias, como um compromisso vinculante dos países em desenvolvimento em adotar as medidas para facilitar o comércio.
RETROCESSO
O pacote de Bali, no entanto, representa um retrocesso importante num dos temas mais sensíveis: subsídios à exportação agrícola.
Em Hong Kong, em 2005, os membros da OMC tinham acertado eliminar esses subsídios até o fim deste ano, o que não ocorreu. Agora, o máximo que conseguiram foi uma declaração política se comprometendo, novamente, a acabar com a distorção, mas sem data definida.
Outro ponto importante do pacote agrícola, que favorece o Brasil, é a melhora na administração das cotas de importação de alimentos dos países ricos.
Os países também se comprometeram a estabelecer uma agenda de trabalho sobre a Rodada Doha dentro de 12 meses. Nas futuras negociações em Genebra, terão que definir como retomar o restante da rodada e quais temas serão discutidos.