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Um prefeito do barulho (o retorno)

Depois de escândalos envolvendo álcool, crack e assédio, Rob Ford se inscreve para disputar reeleição como prefeito de Toronto

ROGÉRIO ORTEGA DE SÃO PAULO

Era uma vez o Canadá, um país tão desenvolvido (11º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano da ONU) e tão plácido que quase nunca era mencionado no noticiário internacional --até que apareceu um prefeito do barulho aprontando altas confusões.

Essa introdução à moda da "Sessão da Tarde" resume o impacto provocado por Rob Ford, 44 anos e estimados 118 quilos, em Toronto, maior cidade canadense (2,8 milhões de habitantes) e líder em rankings de qualidade de vida.

Os escândalos que chamaram a atenção para Ford fora do Canadá envolvem crack, aparições bêbadas em vídeo, acusações de assédio e declarações desconcertantes.

Apesar de tudo isso, ele se tornou ontem o primeiro candidato inscrito para a eleição municipal de outubro. Prometeu "Ford more years" (trocadilho com "four more years", mais quatro anos) e disse ser o melhor prefeito da história de Toronto.

A chance de reeleição é concreta. A popularidade dele se mantém --o que não impediu a Câmara de Toronto de cortar 60% de suas verbas de gabinete e autorizar assessores a se reportar ao vice, o discreto Norm Kelly.

*ESTUPOR ALCOÓLICO'

Filho de um empresário e político, Ford começou a trabalhar no negócio da família (fábrica de etiquetas Deco, vendas anuais de US$ 100 milhões) depois de deixar a faculdade de ciência política.

Em 2000, ele se casou com a namorada do ensino médio, Renata, com quem tem hoje um casal de filhos. Vereador em Toronto por dez anos, assumiu a prefeitura em 2010.

Sua gestão foi polêmica desde o início: logo no primeiro ano, gastou US$ 400 mil para remover ciclovias cuja instalação custara US$ 59 mil e se recusou a comparecer à Parada Gay de Toronto, ações que o indispuseram com setores mais à esquerda.

Seus problemas com álcool e drogas, porém, só começaram a ficar evidentes em maio de 2013, quando imagens que o mostravam fumando crack vieram à tona. O vídeo fazia parte da investigação policial sobre um amigo de Ford acusado de tráfico e extorsão.

Em novembro, após meses dizendo que as alegações eram "ridículas", Ford viu-se obrigado pela polícia --que informara ter cópia do vídeo-- a reconhecer que consumira a droga. E admitiu que poderia também estar bêbado: "Fumei crack, OK? Sou viciado? Não. Experimentei? Talvez, numa das minhas situações de estupor alcoólico".

Logo apareceram outro vídeo --cheio de palavrões, em que Ford ameaça matar uma pessoa não identificada--, outra confissão de culpa do prefeito ("eu estava extremamente embriagado") e outro pedido de desculpas aos eleitores.

Em seguida, descobriu-se que ex-assessores seus o acusaram de "comportamento impróprio" numa festa em 2012, incluindo cocaína, prostitutas, alusões racistas a um motorista de táxi, insultos sexistas a assessoras e a alegação de que teria feito sexo com uma delas, Olivia Gondek.

A resposta do prefeito chocou ainda mais a família canadense: "[A acusação] diz que eu queria comer a xoxota dela'. Eu jamais diria uma coisa dessas. Sou casado e feliz e tenho mais que o suficiente para comer em casa".

Na sequência --adivinhe--, Ford pediu desculpas pela "linguagem inaceitável" (vídeo com os "greatest hits" do prefeito, editado pelo jornal "The Guardian", termina com cinco pedidos de perdão).

Para coroar um mês difícil, o prefeito tornou literal seu estilo "trator": na sessão da Câmara que votou a redução de seus poderes, ele investiu contra manifestantes nas galerias e, no caminho, atropelou a vereadora Pam McConnell (é verdade que a ajudou a se levantar em seguida).

Depois da admissão do uso de crack, em vez de cair, a aprovação do prefeito subiu 5%. No fim de 2013, embora a maioria dos eleitores da cidade pedisse sua renúncia, 40% elogiavam sua gestão.

Para a jornalista americana Hadley Freeman, Ford representa a "parte insatisfeita" de Toronto, avessa aos liberais de classe média-alta. Esse segmento vê o prefeito como trabalhador, apesar da riqueza dos Ford, e homem de família, apesar das acusações de traição e sexismo.

O investimento na imagem de "cara comum", por oposição à elite, é o que explica sua popularidade, analisa Freeman, que lembra a ex-governadora do Alasca e resume: "Rob Ford é Sarah Palin com um cachimbo de crack".


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