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Clóvis Rossi

Ganhou a Crimeia, perdeu a Ucrânia

Sanções não farão Putin desistir da península, mas podem obrigá-lo a abandonar o resto do país

A fina ironia de Jean Meyer, do Centro de Investigação e Docência Econômica do México, é a mais perfeita definição para o efeito das sanções que o Ocidente está impondo à Rússia: "É como tocar a flauta para parar a tormenta".

Tudo leva a crer, pois, que o presidente russo, Vladimir Putin, levará a Crimeia. Não significa, porém, que as sanções sejam totalmente ineficazes. Podem, sim, dissuadir a Rússia de ir além da Crimeia na sua ofensiva sobre a Ucrânia.

Afinal, a economia russa não está exatamente no seu melhor momento, e as sanções acrescentarão dificuldades, como é óbvio. "Uma recessão será difícil de evitar", dizem, por exemplo, economistas do banco público VTB Capital, citados pelo "Monde". Eles preveem uma contração da economia nos segundo e terceiro trimestres e, no conjunto do ano, crescimento zero.

Mas a Crimeia é, para Putin, mais relevante do que uma retração econômica. Seria uma humilhação insuportável recuar agora, depois de tudo o que se fez e se disse a respeito do plebiscito de domingo e da decisão de, supostamente, proteger os russos da península.

O que as sanções e a reação ocidental podem provocar é uma moderação nos passos seguintes. A Rússia pode adiar por algum tempo a efetivação da anexação da Crimeia. É bom lembrar que um referendo similar em 2006, na Transnístria (região separatista da Moldova), deu resultado igual (97% favoráveis à independência imediata e uma posterior associação com a Rússia). Até hoje, oito anos depois, tal associação não se efetivou.

Há margem, portanto, para dar tempo a uma negociação que possa acomodar os interesses russos na Ucrânia, reconhecidos no fim de semana pelo secretário de Estado John Kerry, sem a necessidade de ocupar também sul e leste do país, regiões em que há forte presença de russos.

O fato é que ganhar a Crimeia, como aconteceu no domingo, não significa necessariamente que Putin seja o grande vencedor da crise. "Perdeu um país que desde sempre formou parte da órbita russa", escreve para "El País" Moisés Naím, analista internacional que já foi colunista da Folha.

Refere-se, como é óbvio, à Ucrânia, que, sempre é bom lembrar, até fevereiro estava desprezando a Europa para aliar-se à Rússia e, agora, depois da queda de Viktor Yanukovich, faz o exato oposto.

O cenário é como o descreve Adrian Karatnycky, pesquisador sênior do Atlantic Council:

"O desenlace da agressão de Vladimir Putin na península da Crimeia ainda não está definido, mas uma coisa é clara: ele terá poucos aliados internos se tentar ocupar e separar as regiões de fala russa da Ucrânia. Em vez de estimular sentimentos pró-Rússia, as ações de seus militares reforçaram a unidade nacional entre os cidadãos ucranianos e levaram os novos líderes do país a moderar suas ações".

Se a análise é correta, significa que não haverá perseguição aos russos que vivem na Ucrânia, o que seria o pretexto perfeito para a Rússia invadir outras áreas ucranianas.

Se for de fato assim, a vitória na Crimeia é pírrica.


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