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Marcos Troyjo

Brasil sem perfil

Nesse assunto da Ucrânia, o Brasil se faz de tonto. Ainda assim, não será cobrado por potências ocidentais

Nações atuam no teatro global num misto de princípios, interesses e conjuntura. Isto vale para Alemanha, Mianmar ou qualquer país. A (não) posição do Brasil perante acontecimentos na Ucrânia comporta todas essas dimensões.

Brasília invoca noção vaga de "não ingerência". Anódino chamamento ao "diálogo, negociação e respeito aos direitos humanos". Fingir-se de morto, no entanto, colide com o papel que o Brasil projetava para si durante o governo Lula. Basta lembrar do desejado protagonismo na questão nuclear iraniana ou no conflito israelo-palestino.

O Brasil não exerce monopólio da desfaçatez. A atuação de Pequim também é ilustrativa.

A abstenção chinesa durante votação no Conselho de Segurança da ONU que condenava o referendo na Crimeia não deve ser tomada pelo valor de face. Na certeza da negativa russa à resolução, a abstenção equivaleu a veto.

O Brasil deseja fortalecer a plataforma de chefes de Estado e a construção institucional dos Brics. Estes negociam um Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) com US$ 50 bilhões para infraestrutura. Moscou é parte importante nessa dinâmica, cujo encontro de cúpula se realiza em Fortaleza após a Copa.

Nesse assunto da Ucrânia, como em muitos outros, o Brasil se faz de tonto. Ainda assim, não será cobrado por potências ocidentais.

Não que a ausência de repercussão negativa resulte de ação bem pensada da atual política externa. É que várias frentes de interesse do país contam com suas próprias forças paralisantes.

É zero a influência do episódio sobre a intenção do Brasil de tornar-se membro permanente do Conselho de Segurança. Sua reforma, que depende da vontade dos atuais membros, não sai em futuro previsível.

Melhor tirar o cavalo da chuva. A tensão Ocidente-Rússia não convida à modernização do sistema internacional, mas a nova versão do "Congelamento do Poder Mundial" apontado por Araújo Castro nos anos 70.

O "não perfil" brasileiro tampouco será sentido nas relações governo a governo ou no comércio com EUA ou Europa.

Depreciado há tempos, o diálogo Brasília-Washington deteriorou-se ainda mais pela bisbilhotagem da NSA. Para o Planalto, as desculpas americanas são ponto de honra. Como elas nunca virão, Brasil e EUA não acertam o passo. E, com Bruxelas, carregar o Mercosul nas costas já é complicado o bastante.

A flexibilidade moral do Brasil não se explica apenas pelo interesse estratégico em fortalecer os Brics. É, antes, resultado da predileção por cenário em que EUA e Europa têm menor importância relativa.

Tal leitura convém à preferência ideológica dos atuais "influenciadores" da política externa brasileira. Daí não surpreende todo irrealista apego às relações Sul-Sul e nossa maleabilidade ante Cuba, Venezuela, Honduras e Unasul.

O tempo dirá se essa combinação de malabarismo ético com distanciamento do Ocidente serve ao objetivo de tornar o Brasil mais próspero e respeitado no mundo.

mt2792@columbia.edu


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