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Minha História Ibrahim Ismail Khalil, 50

Família devastada

Iraquiano perdeu pai, filho e quatro irmãos em onda de violência entre seguidores dos ramos xiita e sunita do islã

SAMY ADGHIRNI ENVIADO ESPECIAL A BAGDÁ

RESUMO O técnico em refrigeração Ibrahim Ismail Khalil teve a vida devastada pelo sectarismo que assola o Iraque desde a queda de Saddam Hussein (2003). Membro da minoria sunita, como o antigo ditador, perdeu o filho, o pai e quatro irmãos em ataques que ele atribui a milícias xiitas, facção hoje dominante no governo. Ele negou ligação com o velho regime, mas disse que serviu nas Forças Armadas de Saddam.

Sou pai de família e um cidadão iraquiano comum. Trabalhei por 12 anos na Força Aérea do antigo regime, e hoje vivo de consertar aparelhos de ar-condicionado.

Sempre vivemos em paz entre comunidades.

Sou sunita, e minha mulher é xiita. Ninguém nunca se importou se você era de Mossul ou de Basra. As tensões sectárias foram orquestradas pelos americanos, como parte da estratégia de dividir para poder reinar.

Todos os iraquianos se uniram na luta contra a ocupação americana [a partir de 2003]. Ao menos mil homens de Falluja [sunitas] foram lutar ao lado do [líder miliciano xiita] Moqtada al-Sadr.

A primeira coisa que os americanos fizeram no país foi explodir o santuário de Samarra, que é importante para todos os muçulmanos.

Eles fizeram isso para que as comunidades se acusassem mutuamente.

Os Estados Unidos incentivaram a criação de milícias sectárias e pagaram gente para jogar sunitas e xiitas uns contra os outros. Conseguiram fazer isso por meio da propagação de rumores de ódio e ataques iminentes.

No bairro Al Gazalya [sunita], onde eu moro, americanos mataram quatro pessoas e botaram a culpa pelos assassinatos nos xiitas.

Em 2005, meu irmão trabalhava em sua loja quando homens entraram e o estrangularam até a morte.

Quando fui buscar o corpo, o hospital disse que ele tinha sido vítima de um infarto. Mas testemunhas me contaram que os assassinos pagaram funcionários do hospital para não registrar a morte por sufocamento.

Em 2006, perdi mais dois irmãos. Foram mortos por membros do Exército Mahdi [milícia xiita], que roubaram todos os seus pertences. Até uma bicicleta eles levaram.

Precisei pagar propina para poder recuperar os corpos e enterrá-los.

Três meses depois, meu filho estava na rua quando foi atingido pelo disparo de militares americanos que perseguiam uma pessoa que estava numa moto.

Quando meu menino estava internado no hospital, milicianos xiitas que dominavam o bairro reconheceram o seu sotaque [de uma região sunita] e injetaram ar em suas veias com uma seringa.

O seu cadáver ficou todo azul escuro.

Pouco tempo depois, milicianos pegaram o meu pai e o torturaram tanto que, depois de libertado, ele teve um derrame e morreu.

O último a morrer foi meu outro irmão, assassinado por sunitas, como ele.

Ele era policial de trânsito em Al Gazalya quando membros da Al Qaeda o interceptaram e lhe perguntaram porque ele trabalhava para um governo xiita.

Os militantes entraram em sua casa e roubaram tudo o que havia. Como ele não largou o emprego que tinha, eles voltaram e o mataram, juntamente com sua mulher.

O corpo dela, todo despido, foi jogado pelos assassinos no meio da rua.

Não tenho envolvimento com política. Toda essa tragédia na minha vida reflete apenas a perseguição sistemática contra as pessoas da minha comunidade.

Sob Saddam Hussein, tínhamos segurança e estabilidade. A vida era pacata.

PÂNICO PERMANENTE

Hoje vivemos em pânico permanente. A tensão é tão grande que há bairros aonde eu não posso ir.

Estas divisões sectárias são alimentadas pelos atuais governantes, em benefício próprio. Não passam de fanáticos financiados pelo Irã.

De todo modo, todo o aparato político no Iraque é corrupto. Até os atuais líderes sunitas, como o [ex-vice-presidente] Tarek Hashemi e o [vice-premiê Saleh] Al-Mutlak, não passam de bandidos e terroristas.

Eu não voto nestas pessoas de jeito nenhum.

O Iraque vai de mal a pior na mão desta gente. A economia do país está em ruínas, não temos eletricidade e os serviços públicos entraram em colapso.

Se o premiê Nuri al-Maliki conseguir manter-se no cargo após esta eleição, a violência sectária continuará. Tenho certeza.


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