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Entrevista - Aleksandr Dugin

A Ucrânia é o típico Estado falido criado de forma artificial

Aliado de Putin, ideólogo de extremistas russos defende expansionismo e rejeita ideias liberais

GUILHERME CELESTINO DE SÃO PAULO

Por trás de várias das ambições expansionistas da Rússia está o cientista político e professor da Universidade Estatal de Moscou Aleksandr Dugin, 52. Aliado do presidente Vladimir Putin, Dugin é uma espécie de referência intelectual do extremismo no país.

Ele é o criador da teoria do "neoeurasianismo", a formação de um espaço político para a civilização russa, mais ou menos nos moldes da antiga União Soviética.

De 1998 a 2004, foi conselheiro do presidente do Parlamento russo, Gennadiy Seleznyov, do núcleo duro de Putin. Em entrevista à Folha, por e-mail, Dugin, que vem a São Paulo em setembro para um encontro sobre filosofia, diz que a sociedade de seu país não é liberal, defende as leis antigays de Putin e afirma que a anexação da Crimeia é só o início.

Folha - Poderia falar um pouco sobre sua carreira e teoria?
Aleksandr Dugin - Defendo firmemente valores espirituais e religiosos contra a cultura atual materialista, pervertida e decadente.
O eurasianismo é baseado em uma visão multipolar e na rejeição da hegemonia americana. A Eurásia é o território do antigo império czarista russo ou da União Soviética. Chamamos isso de Grande Rússia. Falamos de civilização eurasiana não só para os russos, eslavos e/ou povos de religião ortodoxa, mas também para os povos turcos e aborígenes da Ásia Central, Sibéria e do Cáucaso.

O que o levou a apoiar Putin?
O realismo político de Putin e seu patriotismo emocional o fizeram mover para mais perto de minha própria posição ideológica e geopolítica. Eu apoio Putin porque ele declara e cumpre os objetivos e ideais que são essencialmente meus. Quando Putin chegou ao terceiro mandato [em 2012], isso marcou seu momento de ruptura decisiva com o liberalismo. Agora Putin adotou o eurasianismo.

Putin disse certa vez que o fim da URSS foi a maior tragédia geopolítica do século 20. O que ele quis dizer com isso?
A ênfase está na palavra geopolítica. Putin não lamenta tanto o fim da ideologia soviética, mas sim o colapso do espaço político que representava a Grande Rússia com base na similaridade civilizacional entre a história e as culturas de diferentes grupos étnicos e povos.
O Ocidente sabe pouco ou nada da verdadeira história da Rússia. Às vezes eles pensam que a URSS era somente uma criação comunista e Estados como Ucrânia, Cazaquistão ou Azerbaijão eram independentes antes. O fato é que esses Estados nunca existiram como tal e representam apenas distritos administrativos sem nenhum significado histórico ou político dentro do império russo ou da URSS.
Então Putin quer enfatizar o caráter artificial, casual e sem fundamento desse processo e sugere que esses Estados artificialmente criados são apenas Estados falidos.
Para prevenir esse fracasso, eles precisam ser integrados em um novo quadro geopolítico que seria a União Eurasiana. A ideia não é conquistar ou forçar países independentes e exitosos dentro de uma esfera de influência russa, mas prevenir o inevitável colapso desses países, como previsto em eventos como a separação da Geórgia, em 2008, e da Ucrânia, em 2014.

O que acha da anexação da Crimeia e dos protestos pró-Rússia no leste da Ucrânia?
O leste e sul da Ucrânia têm uma população com uma história e identidade cultural completamente diferente. A Ucrânia é o típico Estado falido pós-soviético, artificial e que nunca existiu antes de 1991 [colapso da URSS]. O sul e o leste são pró-Rússia, antifascista e fortemente pró-soviéticos. Sua população pertence ao mundo russo e à civilização eurasiana.
Isso é apenas o começo do processo: até agora apenas 8 milhões da população com identidade eurasiana e pró-Rússia anunciaram a independência ou entrada na Rússia. Mas há pelo menos 12 milhões com a mesma identidade, que ainda estão sob o controle de Kiev. A luta continua.

A atual situação é um desafio para o renascimento da Rússia como superpotência?
Sim, se a Rússia conseguir lidar com isso, passaremos a viver em um mundo multipolar. Agora, se a Rússia falhar, a unipolaridade vai continuar por mais um tempo. Mas eu duvido que a hegemonia americana possa durar mais tempo. A Rússia vai ganhar.

O que o senhor pensa das leis antigays da Rússia?
Estão certas. O liberalismo insiste na eliminação de toda forma de identidade coletiva. O último tipo de identidade coletiva é o gênero.
A maioria absoluta dos russos tem uma atitude conservadora em relação à identidade de gênero.
O presidente Putin luta com tais leis não contra as relações homossexuais, mas contra a aplicação da ideologia liberal na forma de uma lei obrigatória e contra a normatização e legitimação jurídica do que é considerado perversão moral e psicológica. A Rússia não é um país liberal nem pretende ser.

O sr. disse em artigo no jornal "Financial Times" em março de 2013 que o mundo precisa entender Putin. Como?
Entender Putin é o mesmo que entender o outro. A Rússia é o outro, o diferente.
Nós temos outros valores, outra história, outras ideias, outra moral, outra antropologia, outra epistemologia, diferente do Ocidente liberal moderno.
Se o Ocidente identifica seus próprios valores como universais, é impossível entender Putin.

Leia a íntegra
folha.com/no1460944


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