Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Mundo

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Análise

Independência reforçaria paradoxos político e econômico

DEMÉTRIO MAGNOLI COLUNISTA DA FOLHA

A "Europa", ou seja, o projeto da União Europeia (UE), surgiu no pós-guerra como ferramenta supranacional para salvar os Estados nacionais, amansando os nacionalismos.

O sucesso da "Europa" fermenta os "nacionalismos regionais", pois o mercado unificado e as estruturas geopolíticas da UE viabilizam a existência de pequenos Estados. Na fila, atrás da Escócia, estão a Catalunha, o País Basco, a Flandres e a Córsega.

O moderno nacionalismo escocês configurou-se como um movimento romântico conservador --e minoritário.

Uma mutação recente, concluída depois de 1999, conduziu-o ao leito da esquerda social-democrata, conferindo-lhe acesso à maioria do eleitorado.

O Partido Nacional Escocês (SNP) reativou a campanha pelo "Sim" no plebiscito atacando a austeridade fiscal imposta por Londres e acusando os conservadores (Tories) de conspirar para privatizar o sistema público de saúde na Escócia.

A apropriação da linguagem do Partido Trabalhista, que é unionista, inflamou o sentimento secessionista. Na raiz disso, encontra-se a crise do trabalhismo britânico, cuja credibilidade sofreu o impacto devastador das políticas de austeridade do governo de Gordon Brown.

Em 2011, os trabalhistas perderam sete cadeiras no Parlamento escocês, ficando com apenas 37, contra 69 do SNP, que conquistou 23 novos assentos, obtendo maioria absoluta.

A onda separatista escocesa não foi impulsionada por uma identidade étnica, mas por uma aversão política.

O governo britânico, sob controle dos conservadores, promete um plebiscito sobre a permanência britânica na UE. Destinada a aplacar a corrente de tories "eurocéticos" e reduzir a influência do novo partido anti-Europa (o Ukip), a iniciativa produz uma fissura lógica no discurso unionista. Na campanha, o SNP argumentou que a secessão do Reino Unido funcionaria como um seguro da Escócia contra a ameaça de ser alijada da UE.

"Todo o Reino Unido para os ingleses; a Europa para os escoceses", proclamam os separatistas. Na Escócia, os Tories são um partido quase marginal, com meros 15 assentos parlamentares, e os "eurocéticos" figuram como personagens folclóricos.

Contudo, a secessão da Escócia representaria um passo significativo na via da principal meta dos "eurocéticos", que é retirar o Reino Unido da UE, pois o plebiscito britânico não teria a participação do eleitorado escocês. O ultraconservador Ukip torce secretamente pelo triunfo dos "esquerdistas" do SNP.

"Governos Tories, nunca mais!", anunciou profeticamente Alex Salmond, o chefe de governo escocês, antevendo uma vitória do "Sim".

De fato, numa Escócia independente, o poder seria disputado exclusivamente entre o SNP e os trabalhistas.

O reverso da moeda é que, nessa hipótese, o derrotado David Cameron quase poderia assegurar "governos Tories, para sempre!" no Reino Unido.

Um país para cada partido: a verdadeira fronteira entre a Escócia e o Reino Unido não seria formada por um limite étnico ou cultural, e sim por um político-partidário. Uma nação soberana sem moeda nacional --eis a curiosa bandeira do SNP pelo "Sim".

Confrontados com uma nuvem de incertezas, os separatistas afastam a hipótese de criação de uma moeda e de um Banco Central escoceses.

No lugar disso, prometem que a Escócia independente conservará a libra, se necessário por meio de decisão unilateral. O compromisso equivale a uma abdicação de soberania sobre a moeda.

Na prática, diante da rejeição prévia de Londres de uma união monetária, ele empurraria a Escócia à condição subordinada de países como Equador e Kosovo, que usam moedas de potências estrangeiras. Mas a potência em torno da qual orbitará a economia de uma Escócia independente seria o Reino Unido.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página