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Análise

No fundo, queremos que a igreja pense como nós

O celibato e a ordenação de mulheres também são temas sempre invocados quando se pensa numa agenda de renovação

MARCELO COELHO COLUNISTA DA FOLHA

A Igreja Católica não muda nada. Tudo precisa mudar na Igreja Católica.

As duas frases provavelmente resumem o pensamento geral sobre o que se espera do novo papa.

Começo a perceber que nenhuma das duas é tão verdadeira assim. Uma primeira surpresa veio ao ler o livro do jornalista John Allen Jr, "All the Pope's Men" (ed. Doubleday), um relato para lá de respeitoso a respeito de como funciona a Santa Sé.

Para dar uma ideia de como as coisas mudam no Vaticano, Allen Jr cita um exemplo notável: a pena de morte.

Embora o discurso "pró-vida" pareça estabelecido desde sempre no mundo católico, os papas não simplesmente apoiavam a pena de morte como a aplicavam até uma data relativamente recente.

O ano de 1868 marca a última vez em que a guilhotina foi utilizada no Vaticano. Pode-se dizer, claro, que os papas demoraram quase dois milênios para se convencerem do seu desacerto.

Uma vez aceita a mudança, entretanto, tudo se passa como se a Igreja Católica sempre tivesse pensado assim.

Não digo com isso que o aborto venha a ser aceito com facilidade nos próximos anos. Mas divergências já foram registradas entre os cardeais ultimamente.

Um dos papáveis, Marc Ouellet, chocou o Canadá quando disse, a respeito de uma gravidez por estupro, que a mãe não deveria cometer um segundo crime só por ter sido vítima do primeiro.

Já o cardeal O'Connor, antigo primaz da Inglaterra, defende posição oposta em caso de estupro. Para um não católico, trata-se de atitude mais razoável.

Tudo precisa mudar na Igreja Católica -sou dos primeiros a concordar com isso. Mas é curioso como no fundo torcemos para que mude no rumo de nossas convicções.

Fosse por uma questão de popularidade, os bispos brasileiros poderiam muito bem abandonar sua crítica à pena de morte e, em especial, sua defesa dos direitos humanos.

Achamos que a igreja perde muitos fiéis ao condenar o uso da camisinha. Pode ser verdade. Mas não sabemos quantos fiéis a igreja descontenta ao falar em direitos humanos -garantia absoluta de perda de votos para candidatos a cargo eletivo na periferia das cidades brasileiras.

O celibato dos padres e a ordenação de mulheres também são temas sempre invocados quando se pensa numa agenda de renovação.

Talvez não sejam coisas tão difíceis de adotar, afinal; sem dúvida, estamos falando de assuntos menos vitais (literalmente) que o aborto.

Argumenta-se com frequência, entretanto, que o celibato e outras chateações são responsáveis pela constante queda no número de padres.

Ocorre que, mundialmente, o número de padres (e seminaristas) cresce desde 2000. Segundo o último "Anuário Pontifício", publicado em março do ano passado, a igreja conta com 1.643 padres a mais, no intervalo entre 2009 e 2010. De 2005 a 2010, o número de seminaristas aumentou 4%.

Verdade que a Ásia e a África são as principais responsáveis por esse crescimento. O decréscimo de padres é visível na Europa e nas Américas; de um ponto de vista global, contudo, faz sentido imaginar que esse não seja o maior problema nas cogitações do Vaticano.


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