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Análise igreja

Transparência será primeiro teste para o papa

Cúria parece estar dividida entre campo pró-sigilo sobre dossiê do Vatileaks e outro que defende sua divulgação

MARCELO COELHO COLUNISTA DA FOLHA

O primeiro dia do conclave, se tudo corresponder à lógica humana, deve conhecer uma dispersão de votos em vários candidatos. Testa-se a força de cada um, para que depois as coisas se afunilem.

Um cardeal teria de concentrar, nos próximos dias, os votos de quem quer mudança e transparência na igreja; seu rival seria, por assim dizer, o representante do "status quo", o "partido da Cúria", o desejado pelo camerlengo Tarcisio Bertone.

Quem ocuparia esses dois postos? E, no caso de um impasse entre as duas forças, qual seria o "terceiro", a surpresa capaz de superá-las?

É mais ou menos segundo essa lógica que se repete com frequência a ideia de que, num conclave, "quem entra papa sai cardeal".

Supondo-se que os dois favoritos a esta altura (Angelo Scola e Odilo Scherer? Será?) saiam empatados, o caminho estaria aberto para uma surpresa mais simpática. Luis Tagle, de Manila, apesar de jovem demais, é irresistível como orador, pelo que pude ver no YouTube.

A questão é saber se o "primeiro turno" se dará exatamente entre Scola e Scherer. Se tivéssemos, por exemplo, um "primeiro turno" entre Bertone (a Cúria) e Scola (as reformas), o terceiro nome poderia ser o brasileiro.

Seria Angelo Scola, o arcebispo de Milão, um nome "reformista"? Os italianos falam nisso. O fato é que Scola é um nome muito "ratzingeriano".

Já demissionário, Bento 16 declarou, na frente de Scola e de outros prelados, que a Lombardia (onde fica Milão) deve ser "o coração crente da Europa".

De forma pouco rotineira, Bento 16 transferiu Scola do arcebispado (diz-se "patriarcado" no caso) de Veneza, que já não é pouca coisa, para o de Milão, o mais importante de todos. Scola tem defendido a liturgia em latim.

Se foi de fato séria a cisão entre Bento 16 e a Cúria, teríamos em Angelo Scola um candidato "renovador", contra a burocracia, mas muito próximo de Ratzinger.

Isso faria de Odilo Scherer o "candidato da Cúria", como diz o jornal "La Repubblica"? Cabem dúvidas, eu acho.

Bento 16 determinou que o relatório de 300 páginas sobre os Vatileaks, encomendado a três cardeais idosos demais para participar da eleição, ficasse guardado.

Dois cardeais brasileiros reclamaram do sigilo: dom Geraldo Majella e dom Raymundo Damasceno.

Se for uma tática, é bem pensada: preserva-se dom Odilo Scherer de vocalizar a queixa diretamente, mas se dá a entender que o principal "papabile" latino-americano não quer tanto segredo.

Nas reuniões preparatórias para o conclave, cerca de cem cardeais tomaram a palavra. Noticia-se também que, nessa ocasião, d. Odilo pediu mais detalhes do relatório.

Em matéria de transparência, os 11 cardeais americanos tomaram a dianteira. Realizavam "press conferences" diárias, até receberem a ordem de ficar em silêncio.

Se tudo isso se confirma, parece haver um campo forte na Cúria, interessado em zelar por mais sigilo -não só Bertone, mas também um cardeal como o francês André Vingt-Trois, arcebispo de Paris-e outro, mais adepto da transparência, com brasileiros, americanos e o sul-africano Napier, por exemplo.

O novo papa não poderia dar sinal mais claro de suas intenções reformistas do que divulgar, assim que assumisse o cargo, o conteúdo do misterioso relatório.

Que dificilmente haverá de ser bombástico, claro, dado o estilo geral das comunicações católicas.


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