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New York Times

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Restos de fábrica viram residência em Detroit

Por STEVEN KURUTZ

DETROIT - Allan Hill tem uma fé inabalável em Jesus e uma reação lenta em momentos de susto, características que lhe servem bem no seu lar adotivo. Há sete anos, Hill, 68, funileiro semiaposentado, vive em uma antiga fábrica da Packard, o casco de concreto que já foi sede da fábrica de automóveis há muito tempo desativada e que é agora, nas palavras do blog Motor City Muckraker, "uma desolada terra sem lei".

A Packard é uma notória ruína. Cerca de 40 construções da marca se espalham por mais de 14 hectares na zona leste da cidade, atraindo vândalos e turistas europeus, os quais fotografam as salas vazias e os exteriores caindo aos pedaços.

A escala do lugar -quase um quilômetro de ponta a ponta- o torna fácil de localizar.

Um recente editorial do "Detroit Free Press" descreveu a antiga fábrica da Packard como "um símbolo internacional do declínio de Detroit" e defendeu sua demolição.

Mas, numa manhã invernal, Hill deu uma lição de história a um visitante. "Em 1956, esse lugar era a antiga forja", disse ele. "Os Packards eram carros de luxo, luxo máximo", prosseguiu. "Reis, rainhas e imperadores tinham de tê-los."

Os prédios tinham a vastidão de hangares aéreos e estavam apinhados de ferramentas, de tanques de solda e de uma máquina Ironworker para o corte de metal.

Ao contrário da maioria das construções no terreno, a casa de Hill está estruturalmente sólida e com todas as paredes. Hill disse que o proprietário lhe pediu para se mudar para lá e preservá-la. "Eu tomo conta dela, faço alguma manutenção", disse Hill, explicando que, como zelador, ele arca com a manutenção e os gastos como a conta de luz, mas não paga aluguel.

Ele andou até uma área de escritórios onde um banheiro, um forno e quartos improvisados servem como moradia. "Este é o meu centro nervoso", disse o homem, entrando em um quarto de teto baixo, com estantes de livros e cheiro de cachorro.

Hill atualmente divide o lugar com seu filho Randy e com um vira-lata chamado Chainsaw.

Randy, que já passou dos 40 anos, estava enfiado em um casaco com capuz, com o corpanzil estacionado atrás de um computador.

Apesar da falta de calefação e água corrente, Hill disse que é "uma bênção" morar da fábrica. "Isso tem me dado tempo para refletir sobre a minha vida", disse ele, que passou por dois divórcios e teve problemas com o álcool. "Ver onde eu errei. Ver se posso talvez mudar algumas partes da minha vida."

Num curta-metragem sobre Hill feito no ano passado por dois cineastas de Nova York, ele surge como uma testemunha da deterioração da fábrica da Packard e da própria indústria americana. Hill incorpora alegremente a criminalidade, a pobreza e a justaposição de declínio urbano e renovação que acontece diariamente em Detroit.

Hill disse que, logo depois de se mudar para a fábrica, em 2005, ele começou a frequentar uma pequena igreja. A fé então encontrada e a solidão o reenergizaram. "Se eu tivesse tido esse zelo e esse sentimento antes, meus filhos não teriam se ferrado. Eu não teria me ferrado."

Quando Hill chegou, quase todos os outros ocupantes da fábrica já haviam ido embora, assustados pelos planos estaduais de demolição. Os esforços pela recuperação do complexo da Packard feitos por Dominic Cristini, ex-gerente de um cabaré de danças eróticas que possuía grande parte da área, não desencadearam um renascimento. A prefeitura detém um penhor do local por dívida tributária, e, nos últimos meses, ganharam força os rumores de que o lugar irá abaixo.

Hill disse que seu senhorio quer vender sua parte da usina. Se a prefeitura concordar em comprar ou se outro comprador for achado, ele irá "provavelmente para a reserva", uma referência à reserva sioux Rosebud, em Dakota do Sul, onde sua igreja opera um ministério.

Enquanto isso, ele passa os dias fazendo coisas com os destroços industriais que encontra. Afirma que, morando dentro da fábrica, se sente seguro. "É só quando saio a certas horas que dá uma sensação de insegurança."


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