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New York Times

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Reação a desastre na China revela ativismo

Por DAN LEVIN

LUSHAN, China - Wang Xiaochang entrou em ação minutos depois do violento terremoto que sacudiu a província de Sichuan no mês passado. Ele se conectou às mais populares redes sociais da China e postou pedidos de ajuda. À noite, já havia lançado 480 apelos.

O governo declarou que as estreitas estradas montanhosas que dão acesso a Lushan ficariam abertas apenas a veículos de resgate. Apesar disso, dois dias depois do terremoto de 20 de abril, Wang já estava indo de carona para essa arruinada cidade na companhia de 19 estranhos carregados de equipamentos.

Enquanto os militares limpavam estradas e consertavam fios elétricos, os voluntários transportavam alimentos, água e barracas para aldeias arruinadas e confortavam os sobreviventes do tremor, que matou quase 200 pessoas e feriu mais de 13 mil. "O governo está encarregado das coisas macro, mas estamos fazendo o trabalho que eles não conseguem fazer", afirmou recentemente o ex-soldado Wang, 24.

A rápida reação comunitária ao desastre revela como a sociedade civil chinesa avançou desde 2008, quando um terremoto de magnitude 7,9 em Wenchuan, nos arredores de Lushan, motivou uma onda de trabalho voluntário e filantropia.

A atrapalhada reação do governo àquele sismo, que matou 90 mil pessoas, foi alvo de duras críticas. A indignação cresceu nos meses seguintes em meio a denúncias de corrupção e relatos de que pais de crianças mortas haviam sido detidos após protestar contra o que viam como um acobertamento do desleixo na construção de escolas. Milhares de alunos morreram em desabamentos de escolas durante o terremoto.

Como o governo, que aperfeiçoou seus esforços de resgate e assistência após o terremoto de Wenchuan, os voluntários e os grupos da sociedade civil que começaram a aparecer em 2008 também adquiriram habilidades valiosas para o trabalho em zonas de desastre. Sua capacidade de se coordenar -e, em certos casos, de driblar as tentativas do governo para mantê-los afastados- foi potencializada pelo Sina Weibo, espécie de Twitter chinês que não existia em 2008, mas que hoje reúne mais de 500 milhões de usuários.

Uma das pessoas transformadas pelo terremoto de Wenchuan foi Li Chengpeng, comentarista esportivo de Sichuan que virou ativista cívico. Quando o terremoto de Lushan aconteceu, Li se dirigiu aos seus 7 milhões de seguidores no Weibo e rapidamente organizou uma equipe de voluntários. Eles viajaram à zona de desastre em motos, em ciclorriquixás e a pé, para não congestionar as estradas.

Dois dias depois do terremoto, o grupo de Li distribuiu 498 tendas, 1.250 cobertores e cem lonas -tudo doado- em Wuxing, onde os suprimentos do governo ainda estavam por chegar. No dia seguinte, os voluntários percorreram outras quatro aldeias, entregando água, óleo de cozinha e tendas.

Temendo que a maré de ativismo social se transformasse em oposição ao governo, o Partido Comunista tentou fazer do desastre de Lushan um grito de guerra pela solidariedade política. "Quanto mais difícil a circunstância, mais devemos nos unir sob a bandeira do partido", declarou o jornal estatal "Diário do Povo" no mês passado, louvando a reação da liderança ao terremoto.

No entanto, a ascensão do ativismo digital obrigou o governo a se adaptar. Recentemente, o "Diário do Povo" anunciou que três voluntários haviam sido escolhidos para supervisionar os gastos da Cruz Vermelha na zona do terremoto e publicar suas conclusões no Weibo.

Mas, no terreno, as ações do governo não mudaram. Segundo os moradores locais, faixas vermelhas de propaganda começaram a aparecer em cercas da cidade e em viadutos rodoviários antes mesmo da chegada de água e comida. "Desastres não têm coração, mas as pessoas têm", diziam algumas das faixas.

Os críticos, porém, veem a onipresente propaganda como parte de um burilado roteiro para crises usado pelo governo para guiar a opinião pública. Segundo uma diretriz emitida no mês passado pelo Departamento Central de Propaganda, os jornais e sites chineses estão "proibidos de publicar notícias, análises ou comentários negativos" sobre o terremoto.

Analistas dizem que as legiões de voluntários e de profissionais humanitários presentes em Sichuan ameaçam a narrativa que foi construída pelo governo sobre o terremoto. De fato, alguns chineses suspeitam que tais temores estiveram ao menos parcialmente por trás dos esforços oficiais para demover cidadãos altruístas de virem à região.

A despeito dos alertas para os voluntários ficarem longe, de modo a não obstruírem estradas e se tornarem um ônus para as equipes oficiais, muita gente conseguiu chegar à zona de desastre. "Fiquei realmente surpreso pela quantidade de voluntários que apareceu apesar do anúncio do governo dizendo que eles não eram necessários", disse o conhecido político dissidente Li Huaping, 47, de Xangai, que estava ajudando a montar 50 barracas para serem usadas como salas de aula temporárias.

Após ver a postagem de Wang solicitando ajuda, o cabeleireiro Li Yong, 24, usou suas férias para distribuir suprimentos. Ele disse que isso era o mínimo que poderia fazer em retribuição por ter sido salvo no sismo de 2008, que matou nove parentes seus.

"Eu era jovem demais para fazer diferença", afirmou Li. "Agora eu posso."


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