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Análise - Ellen Barry

Eleitores votam por mudança na Índia

Há seis meses, quando as eleições indianas mal despontavam no horizonte, um condutor de riquixá falava sobre a situação do país.

Havia algo de incomum e um pouco feroz no que dizia; sua queixa não era específica dos motoristas de riquixás, ou mesmo dos trabalhadores pobres. Soava como a reclamação de um cidadão genérico.

"Os membros do Partido do Congresso dizem todas as coisas certas, mas veja a condição do país -outros países foram muito mais longe nos últimos 60 anos. Por que não temos melhores postos de saúde, instituições de ensino, estradas? Por quê? Quem responde por isso?"

Um número suficiente de eleitores acreditou que o Partido Bharatiya Janata (BJP) tinha as respostas: ele conseguiu um histórico mandato na eleição geral realizada entre 7 de abril e 12 de maio, obtendo 282 dos 543 assentos parlamentares, mais do que o necessário para formar o governo.

A Índia que foi às urnas é imensa, agitada e cheia de aspirações. Agricultores gastam até a última rupia que ganham para mandar seus filhos a escolas particulares, na esperança de que eles possam conseguir um emprego num escritório.

Muitas dessas pessoas participaram dos comícios de Narendra Modi, o candidato do vitorioso BJP. Os eventos começavam em clima de festa no interior. Modi abria seus discursos dedicando palavras carinhosas aos seus seguidores.

Havia vezes em que sua agenda lotada podia ser notada na expressão esgotada, mas ele colhia forças do mar de rostos voltados para ele, e os comícios terminavam como um vociferante ataque ao "status quo".

Essa não era a briga para a qual o Congresso Nacional Indiano tinha se preparado, depois de governar durante uma década que foi marcada pelo aumento da renda. No fim do ano passado, Ajay Maken, um dos principais líderes do partido, parecia serenamente confiante a respeito da mensagem a ser transmitida aos eleitores.

Não era uma mensagem baseada em promessas vagas para o futuro, explicou, e sim em coisas concretas que o Congresso já havia feito para "os mais pobres dos pobres". Maken falava sobre leis importantes, sendo a mais ambiciosa delas um projeto que estabeleceu o direito legal à comida para a maioria da população da Índia, o que pode custar US$ 20 bilhões (R$ 44,2 bilhões) por ano.

O projeto foi visto como um rolo compressor eleitoral, que poderia garantir os votos de 148 milhões de pessoas que estão abaixo da linha de pobreza, num total de 814 milhões de eleitores.

Por que não funcionou? Uma razão é que os próprios pobres da Índia mudaram, adotando atitudes e preocupações antes associadas à classe média.

Os indianos estão migrando para as cidades em grande número; mas mesmo aqueles que permanecem nos vilarejos, navegando pela internet com smartphones baratos, estão cada vez mais próximos da maneira como os urbanos pensam.

A infraestrutura dilapidada, há muito tempo tolerada, agora é intolerável. Eles querem empregos.

Há várias gerações, os políticos do Congresso focam fortemente no eleitorado rural, disse K.C. Sivaramakrishnan, coautor do livro "A Handbook of Urbanization in India" ("Um Manual de Urbanização na Índia").

"Há uma certa atitude política que tem perdurado há muito tempo -que o rural é bom, que o rural é simples, que o rural é natural, é bonito", disse Sivaramakrishnan, citando uma crença que remete a Mohandas Gandhi.

Mas esta foi uma eleição nas cidades também, lugares com shoppings de mármore, famílias de migrantes morando sob viadutos e exércitos de alfaiates, ferreiros, serralheiros, sapateiros, motoristas e empregadas.

Os eleitores urbanos há muito tempo eram vistos como um grupo apático. Mas isso acabou sendo totalmente desmentido: o comparecimento às urnas nas cidades disparou quase dez pontos percentuais em comparação a 2009, subindo de 53% para 62%.

O paradoxo para o Congresso é que o partido perdeu parte dos eleitores que mais prosperaram durante sua década no poder. Gaurav, o motorista de riquixá que saiu de uma zona rural em Uttarakhand para morar em Nova Déli, é um exemplo.

Ele reconheceu que está melhor do que seu pai, pois conseguiu comprar um celular e uma TV e tem acesso a bons hospitais. Mas não estava feliz. As vias congestionadas da cidade se tornaram uma frustração para ele.

"Meu desejo é montar algum negócio, para não ficar nessa situação precária -ganhando para comer a cada dia", disse Guarav, que usa apenas um nome.

Ele decidiu apoiar Arvind Kejriwal, o inflamado líder do Partido Aam Aadmi, que cresceu a partir dos protestos populares contra a corrupção.

Mas foi Modi quem conseguiu se conectar com esta Índia cheia de aspirações. Fez isso em parte ao se apegar a suas origens humildes como filho de um vendedor de chá, desdenhando da aristocrática família Nehru-Gandhi.

Num comício em Uttarakhand, milhares de pessoas se espremiam sob uma tenda gritando o nome de Modi. "Coisas que o Congresso não fez em dez anos ele fará", disse Deepak Kumar, 17.

"Os aumentos de preços não param, mas esperamos que Modi consiga segurá-los. Ele vai melhorar a educação. Ele vai limpar o rio Ganges. Há muita sujeira no Ganges."

"Existe muita sujeira em todo lugar", disparou seu amigo Mohit Dhariwal, 14. "Ele vai limpar." Como fará tudo isso? Kumar deu de ombros; não fazia a menor ideia. Mas disse que "se ele não cumprir, vai ser expulso depois de cinco anos" de mandato.


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