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New York Times

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Jihadismo cresce na África após queda de ditadores

Por ROBERT F. WORTH

WASHINGTON - Ao ver que estava cercado por uma rebelião, o ditador líbio Muammar Gaddafi alertou que, caso ele caísse, o caos e a guerra santa tomariam conta do norte da África. "Apoiadores de Bin Laden irão chegar para impor o pagamento de resgates por terra e por mar", disse. "Vamos voltar ao tempo do Barba Ruiva, dos piratas, de otomanos impondo resgates."

Essa desvairada profecia agora adquiriu uma sombria atualidade. No Mali, paraquedistas franceses chegaram neste mês para confrontar o avanço de uma força jihadista que já controla o norte do país. Na Argélia, um bandido islâmico caolho organizou a captura de uma usina de gás internacional, matando ao menos 37 reféns estrangeiros.

Quatro meses depois da morte de um embaixador americano na Líbia, essas ações causam a sensação de que o norte da África está virando mais uma zona de perigosa instabilidade, assim como a Síria. O tumulto nessa região desértica tem muitas causas, mas também serve para lembrar que a eufórica derrubada de ditadores na Líbia, na Tunísia e no Egito teve um preço.

"Esse é um dos lados mais sombrios", afirmou Robert Malley, diretor do International Crisis Group para o Oriente Médio e o norte da África. "A natureza pacífica da Primavera Árabe prejudicou a Al Qaeda e seus aliados ideologicamente, mas, logisticamente, em termos da nova porosidade das fronteiras, da expansão das áreas desgovernadas, da proliferação de armas e da desorganização da polícia e dos serviços de segurança em todos esses países, foi uma dádiva para os jihadistas."

Um complexo cenário jihadista no norte da África desafia o rótulo fácil de "Al Qaeda", com múltiplas facções operando em meio a uma sobreposição de grupos étnicos, clãs e redes criminais.

A comissão independente que investiga o ataque de setembro que matou o embaixador Christopher Stevens em Benghazi (Líbia) culpou as agências americanas de espionagem por elas não terem compreendido as "muitas milícias [da região], que estão constantemente em dissolução, em conflito e em reformulação".

Embora haja sugestões de alianças transfronteiriças entre os militantes, tais ligações parecem fugazes. Seus alvos costumam ser os que a oportunidade oferece, como parece o caso em Benghazi e na Argélia.

Em certo sentido, a crise dos reféns na Argélia e a batalha no Mali são consequências da queda de Gaddafi em 2011. Como outros homens fortes da região, ele havia conseguido controlar -pela repressão ou a cooptação- as várias facções étnicas e tribais do país. Ele agia como uma tampa, reprimindo elementos voláteis. Quando essa tampa foi retirada, e as fronteiras que eram fiscalizadas por poderosos governos tornaram-se mais porosas, houve uma maior liberdade para que vários grupos -sejam rebeldes, jihadistas ou criminosos- se unissem.

Mas a queda de Gaddafi foi apenas a gota d'água, segundo analistas, numa região onde o caos cresce há anos, e onde os combatentes da jihad acumularam enormes reservas financeiras graças ao contrabando e a outras atividades criminosas. Se a retórica dos militantes islâmicos que lutam no norte da África tem a ver com a "guerra santa", a realidade costuma estar mais próxima de uma batalha entre gângsteres.

O autoritário governo argelino agora é visto pela França e por outros países ocidentais como um intermediário crucial para lidar com os militantes islâmicos no norte da África. Mas os argelinos demonstram relutância em se envolver numa campanha militar que pode ser arriscada.

A ação internacional contra a ocupação islâmica do norte do Mali pode empurrar os militantes de volta para o sul da Argélia, de onde eles partiram. Isso seria reverter anos de sangrenta luta por parte dos militares argelinos, que tiveram grande sucesso em expulsar os jihadistas de suas fronteiras.

Os argelinos têm pouca paciência com o que veem como uma ingenuidade ocidental a respeito da Primavera Árabe, segundo analistas. "A atitude deles era: 'Por favor, não intervenham na Líbia. Vocês vão criar mais um Iraque na nossa fronteira'", disse Geoff Porter, especialista em Argélia. "Depois virou: 'Por favor, não intervenham no Mali. Vocês vão criar uma confusão na nossa outra fronteira'. Mas eles foram ignorados, e agora a Argélia diz ao Ocidente: 'Nós avisamos'."

Embora as forças francesas lutem ao lado do Exército malinês, os planos para retomar o norte do Mali dependem do treino de uma força de combate africana e de negociações com alguns insurgentes mais condescendentes. Mas até agora o diálogo não levou a nada, deixando as autoridades malinesas e seus interlocutores ocidentais com poucas opções a não ser a força armada.


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