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Opinião

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Roberto Livianu e Felipe Locke Cavalcanti

TENDÊNCIAS/DEBATES

Mandonismo à paulista

É natural que detentores do poder queiram impedir o Ministério Público de investigar crimes. Às vezes, são eles os próprios réus

A queda da Bastilha em 1789 simbolizou, em meio ao banho de sangue da Revolução Francesa, o fim do absolutismo monárquico.

O combate a esse sistema foi um importante legado da obra filosófica de John Locke, que, além de ser incorporado ao Iluminismo, influenciou também a Declaração dos Direitos dos Estados Unidos em 1776.

Nascia a República. O exercício do poder, que durante séculos foi absoluto, concentrado, hereditário e de origem divina, passa a ter as dimensões da limitação, dispersão e alternância. O ser humano passa a ser o eixo central de preocupação da civilização.

A cidadania hoje se fortalece dentro dos conceitos da democracia representativa e participativa.

Mas bem antes disso, há mais de 400 anos, surgia no Brasil a figura do Ministério Público perante o Tribunal da Relação, na Bahia.

Hoje, há quase 25 anos, a Constituição Cidadã assegura direitos civis, sociais e políticos às pessoas e reafirma nosso caráter político democrático republicano, incumbindo o Ministério Público da concretização da cidadania e da ideia iluminista da limitação do poder.

Em São Paulo, somos 1.900 promotores e procuradores de Justiça atuando em mais de 400 comarcas e foros distritais, investigando, diligenciando, processando, trabalhando em prol de mais de 40 milhões de seres humanos.

Cumprindo nossa missão constitucional, protegemos o patrimônio público, cultural e social, o ambiente, a infância e juventude, os idosos, as pessoas com deficiência, os consumidores e a coletividade.

É natural e compreensível que, para isso, muitas iniciativas do Ministério Público incomodem os detentores do poder. Muitas vezes são eles os próprios réus que temos o dever de responsabilizar por atos desrespeitosos à sociedade. Talvez por isso queiram nos impedir de investigar crimes, juntando o Brasil a um grupo de apenas três países.

Não somos os donos da verdade e para isso existe o direito à defesa e cabe sempre ao Poder Judiciário o julgamento final.

Mas não é razoável que representantes do Legislativo do Estado andem na contramão da marcha histórica da civilização rumo à dispersão do poder preconizada por John Locke já no século 17. Querem amputar os promotores de Justiça, esvaziando o papel da promotoria. Tentam recriar a instituição do rei, com todo o poder, na figura do procurador-geral de Justiça, propondo emenda à Constituição nesse sentido.

Montesquieu, outro inspirador da Revolução Francesa, ao conceber a tripartição do poder, idealizou um Legislativo elaborador de leis democráticas, respeitosas ao interesse público e garantidoras dos direitos da sociedade.

Se é fácil perceber que a concentração de mercado nas mãos de uma única empresa elevará os preços e prejudicará o consumidor, também é fácil enxergar que concentrar poder estatal nas mãos de um só é nefasto para a sociedade. Assim já advertiram o estadunidense Robert Klitgaard, ao falar sobre o controle da corrupção, e o britânico Lord Acton, ao ressaltar que o poder tende a corromper. E que o poder absoluto corrompe absolutamente.

E é óbvio que o exercício do poder disperso nas mãos de 1.900, e não concentrado na caneta de um, é muito mais controlável, menos vulnerável a pressões e infinitamente mais eficiente. Porque quem está próximo aos fatos, conhece-os melhor e terá melhores resultados.

A proposta lembra o coronelismo, de triste memória, fere de morte a Constituição Federal e deve ser barrada, a bem da sociedade e da história do Brasil!


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