Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Opinião

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Nuances do véu turco

Embora enseje grandes discussões filosóficas, a decisão do primeiro-ministro da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, de liberar o uso do véu islâmico em repartições públicas --prática vetada no país desde os primórdios da República, nos anos 1920-- foi ditada principalmente por necessidades práticas.

Com o prestígio abalado pela violenta repressão aos protestos de junho, Erdogan lançou uma série de medidas populares. A lógica é conhecida: no próximo ano, a legenda do premiê, o AKP (Partido Justiça e Desenvolvimento), disputará eleições presidenciais e locais.

A abolição do veto aos "hujub" veio no mesmo pacote de bondades que ampliou direitos da minoria curda e promoveu algumas mudanças no sistema eleitoral.

O caráter eleitoreiro da iniciativa não diminui seu valor simbólico. Como em outras partes do mundo --França, por exemplo--, a batalha do véu é mais um aspecto da guerra cultural que opõe religiosos a secularistas.

Erdogan afirma que apenas assegurou o direito à livre expressão da maioria da população --mais de 99% são muçulmanos. Já os secularistas, que têm o apoio dos mais ricos, instruídos e urbanizados, com forte representação no Judiciário e nas Forças Armadas, acusam o premiê de promover uma agenda oculta de islamização da Turquia --país oficialmente laico.

Em um contexto complexo como esse, ambos os lados parecem ter alguma razão. Erdogan e o AKP já tomaram outras medidas que agradaram religiosos e provocaram horror nas elites republicanas.

Antes dos protestos, o governo baixara restrições à venda de bebidas alcoólicas. Mesmo que seja o desejo da maioria, um Estado democrático não deveria suprimir ou relativizar direitos de minorias.

Já o laicismo a fórceps promovido por Mustafa Kemal Atatürk (o fundador da Turquia moderna), se fazia sentido no contexto dos anos 20, tornou-se herança pouco conciliável com versões mais contemporâneas de democracia.

É difícil sustentar, hoje, que possuir uma identidade religiosa e ter o direito de expressá-la de forma pacífica não esteja entre as garantias fundamentais do cidadão.

Por outro lado, é razoável perguntar se o mesmo preceito valeria para funcionários públicos. No seu cargo, o agente público deveria apresentar-se de forma isenta?

Não há resposta simples para as situações mais nuançadas. Espera-se que a Turquia saiba lidar com essas questões de conhecido potencial explosivo.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página