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Geleia geral

Com diferenças cada vez menores entre partidos, não é surpresa que valores de direita e de esquerda não influenciem intenção de voto

A rigor, pouco há de surpreendente no fato de a preferência ideológica ter influência apenas marginal nas intenções de voto dos brasileiros, conforme mostrou pesquisa Datafolha realizada na sexta-feira.

Diferentemente do que se verifica em alguns países europeus, como França e Itália, a tradição brasileira nunca primou pela coerência ideológica no campo político. Prevalece, por aqui, a busca pelo consenso, não pelo dissenso; a tendência a acomodar, não a repelir.

Nada há de errado nesse traço cultural. Nos Estados Unidos, democracia mais antiga e mais estável do mundo, os dois principais partidos mantiveram por décadas um grau de mistura doutrinária muito maior do que a polarização recente parece sugerir --e é difícil sustentar que as atitudes extremadas de agora sejam necessariamente positivas para aquele país.

Tal característica, entretanto, é exagerada no Brasil. Segundo o Datafolha, a presidente Dilma Rousseff (PT) tem, da centro-esquerda à direita, praticamente o mesmo percentual de intenção de voto. Diferenças, somente dentro da margem de erro. Só as preferências dos eleitores de esquerda distinguem-se das demais.

O cenário repete-se com o senador Aécio Neves (PSDB), o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), e a ex-senadora Marina Silva (PSB).

As inclinações ideológicas do eleitorado sem dúvida ajudam a explicar essa indistinção. Basta ver que, dentre dez perguntas formuladas pelo Datafolha, somente duas dividiram a sociedade ao meio --pena de morte e atuação dos sindicatos. Nas demais, os entrevistados posicionaram-se ora mais à esquerda, ora mais à direita.

Há, porém, outro aspecto que deve ser levado em conta, com maior peso: candidatos e partidos costumam borrar as fronteiras que os distinguem. É a geleia geral, expressão do poeta Décio Pignatari consagrada há décadas para descrever a falta de substância ideológica da política nacional.

Não é apenas em suas cartilhas que as legendas mostram-se nebulosas. Os nomes dos partidos, atualmente, pouco dizem a respeito das ideias que pretendem defender --quando há alguma.

É ilustrativo o sumiço das siglas explicitamente de direita --cujos valores atraem 49% da população. No Brasil pós-redemocratização, oito delas usaram o "L" de "liberal". Atualmente, entre os 32 partidos registrados, apenas um preserva a palavra: o PSL, que cuidou de incluir também o "S" de "social".

Houvesse conteúdo programático, alguma incerteza ideológica seria problema de somenos. O caso brasileiro, no entanto, é preocupante. Mais que uma questão de cultura, o vale-tudo "pós-ideológico" é a expressão de uma política dominada por interesses personalistas e paroquiais.


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