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Flávio Luiz Yarshell

TENDÊNCIAS/DEBATES

O juiz de primeira instância deve ter mais poder?

sim

Por uma Justiça célere

No ano em que o Código de Processo Civil completa 40 anos, as atenções estão menos voltadas para ele do que para o projeto que, oriundo do Senado, tramita agora na Câmara dos Deputados.

É natural que seja assim. A renovação é oportuna. O advento de uma nova Constituição (1988), a preocupação com o acesso à Justiça, as sensíveis modificações de ordem econômica e social que redundaram na edição de inúmeras leis extravagantes e, finalmente, as alterações havidas no próprio código dele fizeram, em alguma medida, um instrumento assistemático e defasado.

A proposta de mudança convida a refletir sobre os poderes que a lei confere aos juízes --em particular, os de primeira instância.

Há quem, a propósito, enxergue no projeto o prenúncio do apocalipse. Preservada tal convicção, o temor é infundado. Os poderes ali conferidos ao juiz não vão substancialmente além daqueles que a lei vigente já lhe atribui. Não há supressão significativa de meios de impugnação de decisões.

O fato de se prever taxativamente as hipóteses de recurso contra decisões tomadas no decorrer do processo pode ser infeliz. Mas não comprometerá o devido processo legal.

Pode até ser que, no futuro, floresçam arbitrariedades no Poder Judiciário. Mas dificilmente será caso de se atribuir a responsabilidade disso ao novo Código de Processo Civil.

No extremo oposto, há também quem veja no projeto a mudança de um paradigma, do que resultaria expressiva redução do tempo do processo. Sem deixar de louvar o otimismo, é preciso cautela com tais expectativas, até mesmo como antídoto para os males advindos das repetidas frustrações.

Basta dizer que o projeto mantém a regra do efeito suspensivo do recurso de apelação --cabível contra a sentença de primeira instância (decisão final pela qual se resolve a controvérsia). Isso impede o imediato cumprimento do que se decidiu e, ainda que indiretamente, estimula a interposição de recursos.

A supressão do efeito suspensivo --previsivelmente dolorosa, pela mudança de arraigada mentalidade-- valeria, por si só, tanto ou mais do que um novo diploma.

A resistência a tal modificação está associada ao temor --que consta ser compartilhado por muitos dos parlamentares-- antes mencionado: dar-se poder excessivo aos juízes de primeiro grau.

Mas, a sociedade precisa enfrentar o dilema que aí se encerra e fazer uma opção consciente. Se nos queixamos de uma Justiça morosa, e se essa morosidade, entre outros fatores, decorre da circunstância de que recursos impedem o cumprimento imediato de decisões, então de duas uma: ou continuamos a nos queixar da morosidade, a pretexto de não colocarmos nossa segurança em risco; ou avançamos e consagramos uma regra que, afinal de contas, não será novidade no sistema e que, apenas para lembrar, já vigora nos processos que tratam de temas locatícios, entre outros.

Não se trata exatamente de dar maiores poderes ao juiz, mas de assumir os riscos que a maior celeridade processual acarreta. Não há como fugir do dilema: para fazer justiça, é preciso tempo para bem conhecer e aplicar o direito ao caso concreto; para eliminar a controvérsia e pacificar, é preciso presteza.

Quanto mais rápido o processo, maior o risco de injustiças; quanto mais moroso, maior a sensação geral de ineficiência e de impunidade. Uma coisa é certa: não há solução fácil para um problema sabidamente complexo.

De qualquer modo, a opção pela retirada do efeito suspensivo não significa dizer que, em cada caso, o tribunal (órgão com competência para julgar o recurso) não possa, diante da relevância dos fundamentos e de eventual risco de dano irreparável, impedir a imediata eficácia da decisão.

Mas, aparentemente a sociedade não está pronta ou madura o suficiente para tal alteração legislativa, que verdadeiramente modificaria o processo civil.

Seria bom que nos lembrássemos disso sempre que reclamarmos da ineficiência do Estado na prestação da Justiça. Enquanto isso, poderemos até ter um novo código. Mas o processo civil será substancialmente o mesmo.


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