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Ruy Castro

Inventores de mundos

RIO DE JANEIRO - Ao contrário de importantes centenários recentes que quase ninguém comemorou, o de Dorival Caymmi, em abril, fará justiça ao autor de "Dora" e "Marina". Vêm aí especiais de TV, livros, shows, mesas. Uma dessas poderia valorizar não apenas suas canções praieiras, mais famosas, mas também seus sambas-canções --urbanos, noturnos e de intensa beleza--, como "Não Tem Solução", "Sábado em Copacabana" e outros, dele sozinho ou com parceiros.

Conviria explorar a revelação feita por sua neta, minha amiga Stella Caymmi, no excelente "Dorival Caymmi - O Mar e o Tempo" (Editora 34, 2001): a de que o poeta do mar nunca aprendeu a nadar. Mas como? --dirá você. Pois, para mim, este é um dos motivos pelos quais Caymmi era um grande criador. Não precisava jogar-se ao mar de verdade para cantá-lo.

Há quem pense que Guimarães Rosa vivia a cavalo pelo sertão para aprender os segredos que descrevia em seus livros. Mas não era assim. Rosa fez uma única e longa viagem pelo sertão mineiro, em 1952, acompanhado por "O Cruzeiro". O resto, tirou da cabeça, em sua sala no Palácio Itamaraty, onde trabalhava, ou no apartamento em Copacabana, onde morava. Assim eram o sertão de Rosa e o mar de Caymmi: só deles, sem par na vida real.

O inglês Edgar Rice Burroughs foi mais ousado: escreveu 23 romances sobre Tarzan sem nunca ter posto os pés na África. Assim como o alemão Karl May nunca foi ao Oeste americano para escrever as aventuras do índio Winnetou --nem aquele Oeste jamais existiu. A Nova York mítica de 1900, a "Bagdá no metrô", também era toda da imaginação de O. Henry. E a Dublin de "Ulisses" não era exatamente a que James Joyce deixara para trás. Enfim, para isso serve o artista --para inventar mundos.

O praieiro Caymmi não sabia nadar. E o urbano Caymmi, coerentemente, não sabia dirigir.


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