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Carlos Heitor Cony

Golfinhos e condor

RIO DE JANEIRO - O editor de um segundo caderno encomendara a Irineu, um free-lancer que estava sempre disponível, uma pesquisa sobre os golfinhos da baía de Guanabara, golfinhos que constam do escudo oficial da cidade do Rio de Janeiro, mas ausentes, há mais de um século, das águas que a cercam.

Não podia haver matéria mais estranha ao gosto e ao conhecimento de Irineu, mesmo assim ele fez o que pôde, entregou-a dentro do prazo, recebeu o pequeno cachê quase simbólico --e nunca viu a matéria publicada.

Verônica afastou uma pilha de jornais velhos de uma poltrona desbotada, sentou-se, olhou mais e melhor aquilo tudo, que era o que restava dele, do homem que respeitara e, acima de tudo, admirara. Daquela confusão, destacava-se um recorte do "New York Post", sobre o assassinato de alguns líderes políticos que faziam oposição ao regime militar instaurado em alguns países do Cone Sul da América Latina

Pelo que conhecia de diversos textos esparsos que Irineu volta e meia lhe dava para ler, ela sabia que havia uma ordem infernal naquele delírio a que se entregara, como se buscasse o elixir da imortalidade, a espada de Excalibur, o Santo Graal da Távola Redonda.

Ela própria sentia remorso por não ter levado Irineu a sério, na verdade admirara e respeitara o homem que lutava para continuar sendo o que era, mas sem entrar no mérito de sua causa. Se o mundo foi contra ele, ele foi contra o mundo --era o que sempre dizia, já nos momentos de exaltação provocados pela doença que o mataria.

Havia anotações esparsas na pequena mesa em que todas as noites comiam uma pizza ou uma sopa em lata. Havia uma palavra comum em quase todos os recortes: "condor". Irineu morreu seguindo uma pista que nada tinha a ver com os golfinhos da Guanabara.


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