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Opinião

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Anna Veronica Mautner

Do primeiro sorriso à despedida

Da solidariedade inicial, do encantamento, cada um de nós passa, em menos de 20 anos, à subordinação ao grupo, à tradição, ao Estado

O que nasce primeiro: a fé, a esperança ou a solidariedade? De onde tiramos o exemplo e como aprendemos a controlar aquilo que contraria essas qualidades indispensáveis ao convívio humano?

Tais qualidades são indispensáveis do primeiro sorriso do recém-nascido até o olhar saudoso de despedida com o qual encaramos o mundo que vamos deixando --um olhar que não se aprende, resultante de toda uma vida.

Só podemos nos despedir porque tivemos a oportunidade de conhecer. O primeiro sorriso, por outro lado, é o da descoberta: existe um mundo fora de mim.

Entre esses dois momentos, aprendemos. Vivendo se aprende sem parar. Mesmo trancados em uma caverna, em uma cela escura, temos pensamentos, sensações que geram sentimentos, que nos surpreendem. Cada surpresa é um reviver do primeiro sorriso. Que bom que o mundo é cheio de coisas a descobrir!

Os grupos humanos --famílias, tribos, nações-- organizam-se em torno da descoberta da despedida. Essa é a introdução para perceber que família nuclear, grupo de convivência, vizinhança, escola, geração são codinomes de espaços de interação. A família nos ensina a sentir; a escola nos ensina a competição e a sermos avaliados e assim continuamos, seja com vistas à procriação, seja ao acasalamento ou à produção via aptidão e divisão do trabalho.

Não falo de legislação, de dogma, rituais obrigatórios. Isso é um outro capítulo: é a organização formal do agrupamento humano defendendo-se para não capitular. Quando grupos que passaram pelo mesmo processo, mas criaram modos diferentes de ser se encontram, nasce a epopeia da paz (encontro) ou a guerra.

E tudo isso é gerado espontaneamente, naturalmente na família, no grupo, na escola. Sem isso, não há nação. Aí a nação toma as rédeas: redige, escreve, grava na pedra, no pergaminho, a história de cada povo.

Da solidariedade, da descoberta, do encantamento, passamos à subordinação ao grupo, à nação, à tradição, ao Estado. Em menos de 20 anos, cada um de nós passa por todas essas etapas. Cada grupo, cada nação passa por essas etapas igualmente. Os homens e a nação não são nada diferentes. Descobrem, criam, se instituem e se subordinam.

E onde ficam os libertários? São marginalizados, mas influem ininterruptamente na direção da transformação. Assimilando tecnologia nova, seja a roda ou o telescópio espacial Hubble, o homem capta as funções e se transforma.

No filme "2001, uma Odisseia no Espaço", quando o pré-humano descobre que a pedra na ponta de um galho é mais forte do que o soco, nascemos nós, humanos, que nos transformamos sem parar.

A fé se pode ter com vocabulário restrito. A esperança carece da definição do que se espera. E a solidariedade é uma força que une as esperanças e a fé em comum. E esse processo nos acompanha e nos transforma ao longo da vida.


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