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Opinião

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Claudio Weber Abramo

Fantasias plebiscitárias

A Constituinte exclusiva e soberana seria formada por indivíduos em tudo idênticos aos que compõem o Congresso Nacional

No último fim de semana, iniciou-se um plebiscito informal para decidir sobre a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte exclusiva e soberana para realizar a "reforma política". Anunciou-se que prosseguiria até este domingo (7).

Não se trata, de fato, de um plebiscito, dado que não há controle de votos. De toda forma, ainda que descontrolado, não se deve duvidar de que uma grande quantidade de gente "aprovará" a ideia de boa-fé.

A justificativa que seus promotores apresentam é que semelhante conclave teria legitimidade para promover uma reforma política, atributo que faltaria ao Congresso Nacional. Entre os mentores da ideia estão a Igreja Católica, a Ordem dos Advogados do Brasil e o Movimento Contra a Corrupção Eleitoral, que tem forte presença de membros do Judiciário e do Ministério Público. Uma porção de "coletivos" e entidades subscreve a iniciativa.

Já nisso há algo de insólito. Baluartes do conservadorismo se unem a um ajuntamento anárquico de entes para apregoar a ilegitimidade do Congresso. Nem sequer o que pretendem é um debate aberto. Seu proselitismo é explícito no sentido de empurrar uma determinada medida apresentada como panaceias, a proibição do financiamento privado de campanhas eleitorais.

De todo modo, qual é o fundamento daquilo que se propõe? Parte-se da constatação, verdadeira, de que alterações no sistema político-eleitoral tentadas no Congresso tendem à timidez. Daí deduzem que isso ocorre porque "a vontade popular" não seria representada. (A "real" representação é reivindicada pelos "coletivos", pela OAB, pela igreja, e a vontade de que se fala é a vontade dos dirigentes desses entes.)

Os idealizadores do plebiscito simplificam não só os interesses em jogo, como também as consequências concretas de se adotar este ou aquele arcabouço normativo. É a percepção desses fatores conforme cada ponto de vista que leva à imobilidade do Congresso.

Mesmo que, para fins de argumentação, se admita que os promotores do plebiscito têm em vista debater o ordenamento político, e não propagandear a sua própria solução, eles se equivocam ao supor que tentativas de democracia direta teriam melhores condições do que o Congresso de levar a questão adiante.

Digamos que se convoque a assembleia. Haverá campanha para eleger os constituintes, com tempo na TV e nas rádios. Quem participará, como se organizarão, como os tempos serão distribuídos?

Será que os cultores da noção de fato imaginam que os partidos políticos se eximirão de concorrer? Ou, quiçá, supõem possível proibi-los de tomar parte?

Há alguns dias ouvi de um simpatizante do esquema que os constituintes seriam escolhidos entre representantes de centrais sindicais, movimentos reivindicatórios diversos, ONGs de cá e de lá.

É claro que a esses entes dotados de pretensa pureza seriam adicionadas associações profissionais, as confederações empresariais e mais todo tipo de guilda e liga. A menos que, outra vez, se pretenda impedi-las de se fazer representar.

Imaginemos, num lapso alucinatório, que seria possível organizar um debate eleitoral inteligível entre representantes desse caos. Quem os cultores da democracia direta imaginam que teria maior probabilidade de ser eleito? O fulaninho da associação comunitária da rua do Pardal? Ou o representante do PMDB, do PSDB, do PT, da Central Única dos Trabalhadores, dos ruralistas, dos evangélicos, da Confederação Nacional da Indústria?

A saber, a Constituinte exclusiva seria formada por indivíduos em tudo idênticos aos que compõem o Congresso Nacional. Dada a multiplicidade de interesses, e dado que os interlocutores seriam os mesmos, por que se imagina que o resultado da discussão seria diferente numa assembleia "exclusiva" daquele que se observa no Congresso?


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