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Ruy Castro

Mágicas e exatas

RIO DE JANEIRO - Diz-se que é mais fácil para um homem trocar de mulher do que de time. Conheço também gente que trocou de profissão, de ideologia política, de nacionalidade, de "opção" sexual e até de sexo, mas continuou firme na preferência clubística. E houve outro quesito que, em certa época, disputou com o futebol essa fidelidade carnívora -quando tivemos de trocar a máquina de escrever pelo computador.

Foi em meados dos anos 80. Éramos felizes com nossas Remingtons e Olivettis, até que uma pressão vinda de todos os lados começou a nos empurrar para o computador doméstico. Muitos resistimos à novidade, como quem defende a bandeira do seu clube. No meu caso, fiquei firme até 1988, quando dois amigos me confessaram sua conversão àquele aparelho silencioso, que permitia reescrever e mover frases e parágrafos sem o cansativo recurso de bater xis, cobrir de tinta e fazer a emenda a mão ou a máquina. Os amigos eram Millôr Fernandes e Sérgio Augusto.

Por causa deles, aderi. Afinal, pensei, estava apenas trocando uma máquina de escrever por outra. E quer saber? Nunca me arrependi. Acho até que a geringonça me salvou a vida, permitindo-me produzir com metade do esforço e o dobro da velocidade. Minha Remington foi para um armário, onde está até hoje, há anos sem a esmola de um olhar.

Um livro enviado pela amiga Maria Amélia Mello, no entanto, me fez repensar o caso: o delicioso "Retratos Parisienses", com entrevistas e perfis de escritores e pintores franceses por Rubem Braga, pela José Olympio. Logo nas primeiras páginas, reproduz-se um original de Rubem -uma página datilografada, sobre seu encontro com Jean-Paul Sartre, estupidamente bem escrita e quase sem emendas.

Era possível escrever a máquina, de primeira, sem erros e já com as palavras mágicas e exatas. Bastava ser Rubem Braga.


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