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Opinião

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Flavio Comim

TENDÊNCIAS/DEBATES

O mirabolante IDH de 2012

O "IDH sombra", calculado por quem diz que o Brasil avançou, faz pouco sentido técnico e impossibilita comparações com outros países

No princípio, parecia que a divulgação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) brasileiro de 2012 seria um evento monótono. Afinal, os cálculos oficiais do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) indicavam uma estagnação da posição brasileira (85ª) no ranking em comparação a 2011, repetindo a mesma notícia do "progresso a passos lentos" dos últimos anos.

Mas a forte crítica do governo brasileiro aos números divulgados e a criação de um "IDH sombra" fizeram com que esse lançamento gerasse muitas controvérsias interessantes. Dependendo de como se olhe, pode-se concluir que o país está pior, igual ou melhor no seu desenvolvimento humano, o que configura uma situação extraordinária.

Aqueles que acham que o país está pior se guiam pela posição nominal do Brasil no ranking. Desde 2005, quando o IDH brasileiro ocupou a 63ª posição, o país vem caindo na lista. Em 2010, o Brasil estava em 73º, em 2011 em 84º, em 2012 em 85º (a pior posição do Brasil no ranking do IDH de toda a história).

Difícil negar que a distância que separa o Brasil do topo dos países mais avançados no IDH não vem aumentando, quando a taxa de crescimento do IDH do país caiu de 1,26% ao ano (de 1990 a 2000) para 0,73% ao ano (de 2000 a 2012).

Aqueles que acham que o país está na mesma levam em conta um argumento técnico, que, apesar de sensato, diminui a transparência pública do indicador. Para fazer uma comparação apropriada, argumenta-se, é preciso recalcular o IDH do ano anterior, atualizando-o. No caso presente, se calcula um "novo IDH de 2011" para calcular o progresso do país em relação a 2012.

Ao fazer essa conta, se "descobriu" que o Brasil não estava na posição 84 em 2011, como anunciado antes, mas sim na 85. Nessa leitura, que é a oficial, o país permaneceu constante no ranking. Os leitores de George Orwell podem, no entanto, se sentir vindicados pela obscuridade das revisões contra-factuais que acontecem em anos que "nunca existiram".

Aqueles que acham que o país está melhor, como o governo brasileiro, reclamam do uso de dados defasados no cálculo do IDH, promovendo o "exercício" (assim foi chamado) de um recálculo de um "IDH sombra", baseado só em dados brasileiros, mesmo estando cientes de possíveis erros na sua elaboração.

Assim, em vez de 73,8 anos de expectativa de vida, foram usados 74,1. Em vez de 7,2 anos médios de estudo, foram usados 7,4. Em vez de 14,2 anos esperados de estudo, foram utilizados 15,7. E em vez de US$ 10.152 de renda per capita, foram usados US$ 11.547 (onde claramente parece haver um erro). Ignorando todos os problemas de harmonização internacional desses dados, chegou-se à conclusão de que o Brasil, no ranking de 2012, teria subido 16 posições, passando para a 69ª.

O mirabolante de tudo é que o "exercício" do "IDH sombra" faz pouco sentido técnico e desrespeita o trabalho de harmonização de estatísticas internacionais feito pela equipe do Pnud. Além do mais, não permite comparações com outros países, servindo para pouco.

Por sua vez, o recálculo retrospectivo do IDH parece correto para o valor bruto do índice, mas pode enganar quando se trata do seu ranking. Quando esse recálculo é feito em cima de um IDH calculado com valores máximos e mínimos móveis (desde 2010), produzimos um índice que é a antítese dos valores de transparência e estímulo à razão pública promovidos pelo IDH.

Fiquemos com o mais correto e mais simples. Evitemos o mirabolante. Assumamos nossas deficiências estruturais em prol da justiça social no nosso país.


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