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Entrevista - Marcos Nobre

Do ponto de vista político, o caso do mensalão acabou

PARA O FILÓSOFO E CIENTISTA POLÍTICO, A PRISÃO DOS CONDENADOS OITO ANOS APÓS A DENÚNCIA ORIGINAL FECHA O CICLO POLÍTICO DO ESCÂNDALO

RICARDO MENDONÇA DE SÃO PAULO

Para o filósofo Marcos Nobre, pesquisador do Cebrap e ex-colunista da Folha, o mensalão não existe mais como fato político.

Ele diz que as condenações de figuras políticas importantes foi algo "excepcional" e diz que as penas foram mais duras que o convencional, mas não ilegítimas.

O ministro Joaquim Barbosa, diz, representa uma novidade "ambígua". "Deu vazão a um sentimento social de rejeição à política", mas não oferece nada como alternativa.

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Folha - As prisões começam a sair. O que dá para dizer agora?
Marcos Nobre - O que eu diria é que o mensalão terminou como fato político. Não do ponto de vista jurídico. Mas político, acabou

Já não estava encerrado antes?
A impressão era de que o exame dos embargos havia reaberto tudo. Falaram em novo julgamento, o que, juridicamente, é um equívoco. Agora todos entenderam que são só recursos.

Se fosse descrever para um estrangeiro, como definiria esse caso?
Aconteceu algo excepcional: o julgamento de políticos importantes com condenação. Para um estrangeiro pode parecer assustador. Não teve no passado? Difícil comparar, o passado no Brasil é muito pouco democrático.

O que achou das penas?
A condenação de figuras políticas importantes explica a dureza das penas. Se fosse um julgamento criminal comum, as penas não teriam sido tão altas. Foram altas porque é inédito.

Roberto Jefferson falou que agora a política pode ser melhor. Alguma evidência disso?
Não. Nenhuma chance de melhorar a política com isso.

Falam em exemplo de cima, fim da certeza da impunidade.
Não acredito nessas teorias de função dissuasória da pena. O que estou querendo dizer é: se fosse comparar com crime comum, corrupção comum, não de figuras públicas destacadas, as penas não seriam tão altas.

Então foi injusto, é isso?
Não, não. Justiça ou injustiça é um ponto de vista moral e político. Do ponto de vista jurídico, a gente pode dizer se uma questão é legítima ou ilegítima. Ela se dá no âmbito de uma discussão pública e política mais ampla. Pode haver uma reação pública de tal ordem que faça com que uma decisão legal fique ilegítima. Hoje, no jogo político atual, está parecendo como uma sentença legítima.

Se é assim, o tempo pode deslegitimar essas sentenças?
Pode. Daqui para frente pode ser que as penas aplicadas não sejam tão graves. Ai vão dizer: "olha, isso prova que a sentença do mensalão foi dura demais". Estarão querendo dizer: "não foi totalmente legítima".

E qual é o seu palpite?
Todos serão julgados a partir dessa métrica agora? Acho que, por um bom tempo, sim. É a questão da legitimação do Judiciário. Já que estabeleceu a barra nesta altura, assim ficará por um bom tempo. Até que seja algo comum condenar políticos. Mensalão mineiro? A dureza vai ser igual.

E o comportamento do relator Joaquim Barbosa? Como personagem, foi uma novidade?
Esse cara... Ele foi um canal de expressão de uma rejeição difusa do sistema político. Novidade, sim. Um sentimento difuso de rejeição que não tem conteúdo e é pouco politizado. Ao mesmo tempo, expressa uma raiva social muito interessante. Raiva contra o sistema político, contra a discriminação histórica. E essa rejeição difusa da política, ela se expressa de maneira brutal e grosseira. Isso introduz um elemento novo no Judiciário, pois o Judiciário gosta de se entender num clube de cavalheiros. Ele rompe com isso.

Diria que é um avanço?
É ambíguo. É importantíssimo dar vazão a um sentimento social de rejeição à política tal qual ela é feita. De outro lado, essa expressão bárbara, bruta, não ajuda a construir uma linguagem alternativa ao bacharelismo, não constrói uma coisa nova. E ele não enfrentou contraponto. O [Ricardo] Lewandowski é um juiz de carreira. Era um [ex-]promotor [Barbosa] contra um juiz.

Quem poderia ser esse contraponto ao ministro Barbosa?
Quem fez foi o [Luiz Roberto] Barroso, claramente contraponto ao Barbosa. Primeiro, é um advogado. Segundo, tem uma noção de como articular o pensamento e enfrentar midiaticamente a brutalidade de Barbosa. E consegue falar a língua de gente, não a de seus pares apenas. Ele é uma enorme novidade.

Quem mais te impressionou?
Rosa Weber. Ela deu votos incríveis. Pode representar aquilo que possa ser uma nova cultura jurídica, falar para os outros sem as tecnicalidades. Mas ela tem de dar o passo da comunicação.

E quem foi o oposto disso?
Teve o desequilíbrio do decano. Celso de Mello foi um dos votos mais lamentáveis. Julgando crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, fundamentou a decisão com a expressão "atentado à democracia". Um desequilíbrio flagrante. Se há atentado à democracia, há atentado à Constituição. Então ele estava chamando as pessoas de terroristas. Quem está sendo julgado são indivíduos. Não é o sistema político nem os partidos, não é terrorismo. Atentado à democracia? Absurdo.


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