Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Poder

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Coronel admite ter matado na ditadura

Em depoimento à Comissão da Verdade, Paulo Malhães diz que corpos eram mutilados para evitar reconhecimento

Oficial reformado contraria entrevistas e diz ter descumprido ordem para sumir com ossada de Rubens Paiva

BERNARDO MELLO FRANCO DO RIO

Em depoimento à Comissão Nacional da Verdade, o coronel reformado do Exército Paulo Malhães, 76, admitiu ontem que torturou, matou e ocultou cadáveres de presos políticos durante a ditadura militar (1964-1985).

Ele disse não se arrepender de nada e narrou como funcionava a chamada Casa da Morte, em Petrópolis (RJ), centro de torturas clandestino onde teriam sido assassinadas cerca de 20 pessoas.

Levado em cadeira de rodas e usando camisa cinza, terno bege e óculos escuros, o militar chocou integrantes da comissão pela frieza com que respondia às perguntas.

"Quantas pessoas o senhor matou?", quis saber o ex-ministro José Carlos Dias. "Tantas quanto foram necessárias", respondeu o coronel. "Arrepende-se de alguma morte?" "Não." "Quantos torturou?" "Difícil dizer, mas foram muitos", devolveu.

Sem demonstrar incômodo, Malhães defendeu a tortura como método de investigação e explicou como mutilava cadáveres para evitar que fossem identificados.

"A tortura é um meio. Se o senhor quer saber a verdade, tem que me apertar", disse, acrescentando que aprova o método para presos comuns.

Questionado sobre as mutilações de cadáveres, descreveu a prática como uma "necessidade" e disse que os corpos não eram enterrados "para não deixar rastros".

"Naquela época, não existia DNA. Quando você vai se desfazer de um corpo, quais partes podem determinar quem é a pessoa? Arcada dentária e digitais", disse.

"Quebrava os dentes. As mãos, [cortava] daqui para cima", explicou, apontando as próprias falanges.

Chamando as vítimas da repressão de "terroristas", Malhães disse não ter remorsos. "Quando vejo uma pessoa reclamar que um ente querido morreu, pergunto: se tivesse ficado ao lado da esposa e dos filhos, isso teria acontecido?", acrescentou.

Parentes de desaparecidos, ex-presos políticos e a única sobrevivente da Casa da Morte, Inês Etienne Romeu, foram à sede do Arquivo Nacional para ouvir o oficial. Ele só aceitou falar diante da comissão e dos jornalistas.

Confrontado com nomes e fotos de vítimas, Malhães alegou que não conseguia reconhecê-los. Também se recusou a indicar colegas da repressão, com raras exceções.

Numa delas, disse ter recebido ordem do coronel Coelho Neto, então subchefe do CIE (Centro de Informações do Exército), para ocultar a ossada do ex-deputado Rubens Paiva, morto em 1971. Mas afirmou não ter executado a tarefa, contrariando o que disse recentemente aos jornais "O Dia" e "O Globo".

Ele também apontou o coronel Cyro Guedes Etchegoyen, chefe de contrainformações do CIE, como comandante da Casa da Morte.

"Mesmo com tantos anos de advocacia, me choquei com a descrição da mutilação de arcadas dentárias e digitais", disse o ex-ministro José Carlos Dias. "Eu não diria que ele foi corajoso. É um exibicionista, um sádico."

Em depoimento à Comissão da Verdade no dia 15, a ex-presa política Inês Etienne Romeu, apontou seis agentes da ditadura como torturadores que trabalhavam na Casa da Morte.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página