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J.P. Cuenca

A corrida dos santos

Na corrida que celebra morte de santo em cidade italiana, homens carregam velas de sete metros e 280 quilos

No início, a multidão abre caminho para uma pequena banda de metais, os sacristãos, o padre erguendo uma cruz de bronze, a santa que os braços tentam alcançar em troca da bênção. Nada que você nunca tenha visto numa ci- dade de interior em qualquer nação católica. Mas, subitamente, há um tremor de euforia. As crianças pulam, as mulheres começam a acenar. Do alto da rua, centenas de homens dobram a esquina. Eles usam camisas amarelas, vermelhas ou azuis --todos com calça branca, lenço vermelho no pescoço e na cintura. E descem correndo e gritando, abrindo espaço para o que está por vir.

A cada 15 de maio, a pequena cidade medieval de Gubbio, no nordeste da Umbria (Itália), é palco de uma das mais antigas, complexas e originais festas populares do planeta. Trata-se da "Corsa dei Ceri", que celebra o aniversário da morte do bispo Ubaldo Baldassini, canonizado santo protetor da cidade.

Seria uma procissão normal, se as "ceri" (velas) não fossem pilares de sete metros de altura pesando 280 quilos cada. E se não se tratasse de uma "corsa" (corrida) disputada em alta velocidade por são Ubaldo, são Jorge e santo Antônio.

Cada um dos santos equilibra- se no topo de uma estrutura de madeira, sempre carregada por dez "ceraioli". Eles revezam-se em diversos grupos por duas horas até chegarem à basílica de São Ubaldo, no topo da cidade alcantilada --onde as peças ficarão até o ano seguinte.

A rivalidade parte de um sistema bastante rígido de estratificação social: os partidários de são Ubaldo, vestindo amarelo, são de famílias de construtores, gente que vivia dentro dos muros da cidade. Os de são Jorge, usando azul, comerciantes. E os de santo Antônio, de vermelho, camponeses.

Quem vence? Como são Ubaldo sempre entra primeiro na basílica, se a distância dele até os outros for grande, os amarelos se permitem fechar a porta e humilhar os outros grupos. Os azuis também podem fechar a porta na cara dos vermelhos. De qualquer forma, o vencedor vai ser determinado pela habilidade das equipes, julgada pela população da cidade que acompanha a corrida com atenção pelo circuito labiríntico.

Carregar os ícones de madeira com equilíbrio e velocidade por essas ruas estreitas lotadas de gente sem derrapar ou deixá-los cair é tarefa dificílima, transmitida por gerações desde o século 12.

Como a tecnologia da Liesa (Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro) ainda não chegou aqui, as discussões são intermináveis e ocupam as ruas da cidade até o ano seguinte.

Às vezes, à noite, há brigas, como a que houve este ano entre os partidários de são Ubaldo e são Jorge. Mas isso é exceção: os dois dias de feriado em Gubbio são marcados por dança, música e distribuição de vinho grátis pela rua. Vê-se poucos turistas: ainda é uma festa local para os locais --e não há nada que nos faça crer que deixará de ser assim pelos próximos 900 anos.


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