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Descrição de chapéu Portugal

Morre Mísia, cantora e fadista portuguesa, aos 69 anos, após câncer

Artista colaborou com nomes como Maria Bethânia, Adriana Calcanhotto, Fanny Ardant e Iggy Pop

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Nuno Pacheco
Público

A cantora e fadista portuguesa Mísia morreu este sábado, aos 69 anos. A notícia foi dada por Richard Zimler, escritor americano radicado em Portugal, nas redes sociais. "Estou desolado, pois a minha velha amiga, a cantora Mísia, acabou de nos deixar. Partiu em paz, docemente, sem dores."

Mísia estava internada há pouco mais de uma semana no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, na sequência de mais uma crise relacionada com a longa batalha que desde 2016 travava contra o câncer. Uma batalha com intermitências, com momentos de esperança à mistura com outros dolorosíssimos, que até ao final nunca lhe tiraram a vontade de viver.

A cantora portuguesa Mísia - Divulgação

Nascida Susana Maria Alfonso de Aguiar, no Porto, no dia 18 de Junho de 1955, ainda celebrou o seu 69º aniversário na companhia de muitos amigos, no Café Buenos Aires, em Lisboa. Mesmo debilitada, nesse dia ainda a norteava uma frase em que insistia e que mostra bem a sua força anímica: "Não vou parar de viver, porque sou mais do que a minha doença."

Os seus mais recentes discos, "Pura Vida" (2019) e "Animal Sentimental" (2022) nasceram enquanto enfrentava a doença. O primeiro, num momento de euforia, em que se julgou quase livre do pesadelo; o segundo, que veio acrescido de um livro homônimo, autobiográfico, gravou quando percebeu que a luta não terminara nem terminaria. Mas já tinha começado a "arrumar a casa", com uma coletânea de 40 fados e canções a que chamou "Do Primeiro Fado ao Último Tango" (2016). Em 2019, numa entrevista ao jornal Público, falou assim desses anos: "Desde setembro de 2016 até setembro de 2018 estive a viver uma espécie de um calvário, uma via crucis, duas situações oncológicas graves que me levaram a fazer duas vezes seis meses de tratamentos, onde tive muito para pensar e perceber o que era a minha ideia de pura vida."

Continuou a fazer tudo como se não estivesse doente. "Lembro-me de ter feito as conversas no Museu do Fado com o infusor de quimioterapia colocado, ou fotografias para revistas com roupa larga para não se perceber o infusor. Viajei, fiz concertos, em Lisboa e em Paris, na apresentação de 'Do Primeiro Fado ao Último Tango', em plena quimioterapia." A música foi a sua boia de salvação. "Nunca considerei a hipótese de parar de trabalhar. Não contei nada aos meus músicos, usava máscaras nos aviões, mas dizia-lhes que estava constipada. Tive momentos em que não tinha forças, tinha tonturas, mas quis continuar a fazer a minha vida."

Filha de mãe catalã e pai portuense (que se separaram quando ela tinha 4 anos), não teve uma infância fácil, encontrando apoio sobretudo na avó materna, catalã. Passou a adolescência no Porto, mudando-se, antes de completar 20 anos, para Barcelona e depois para Madrid. Em 1991 voltou para Portugal, instalando-se em Lisboa, e data desse ano o seu primeiro álbum, "Mísia", a que se seguiriam "Fado" (1993) e "Tanto Menos Tanto Mais" (1995).

Gravou-os, não como Susana Aguiar mas já como Mísia, nome pelo qual se apaixonou ao ler a biografia de uma musa parisiense de origem polaca nascida em São Petersburgo, na Rússia dos czares, no ano de 1872: Maria Zofia Olga Zenajda Godebska, que, próxima de nomes das artes como Gide, Mallarmé, Proust, Debussy, Monet, Renoir, Toulouse-Lautrec, Paul Signac ou Coco Chanel, era conhecida pelo diminutivo polaco de Maria, Mísia, tornando-se Mísia Sert ao casar-se com o pintor catalão Josep Maria Sert. E assim, num repente, Susana tornou-se Mísia.

Os discos seguintes, "Garras dos Sentidos" (1998) e "Paixões Diagonais" (1999), vieram firmar a singularidade do seu canto e da sua abordagem ao fado, muito pela via dos poetas e da força das palavras, caminho que nunca abandonaria até ao final. E enquanto cantava nomes como José Saramago, Agustina Bessa-Luís, Lídia Jorge, Hélia Correia, Mário Cláudio, José Luís Peixoto, Vasco Graça Moura, Tiago Torres da Silva, Amélia Muge, Jorge Palma, Vitorino ou Sérgio Godinho, colaborava com nomes como Maria João Pires, Maria de Medeiros, Agnès Jaoui, Maria Bethânia, Adriana Calcanhotto, Fanny Ardant, Isabelle Huppert, John Turturro, Bill T. Jones, Carmen Maura, Miranda Richardson, Sophie Calle, Ute Lemper, Gilbert & George, Iggy Pop, Dead Combo, Legendary Tigerman e tantos outros.

Este texto foi publicado originalmente aqui

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